Estrutura

Alergia à hierarquia: uma epidemia?

Às vezes noto um certo desconforto nos meus interlocutores quando uso a palavra hierarquia para me referir à forma como suas empresas se organizam. Muitos parecem, deliberadamente, evitar o termo, como se ele tivesse alguma conotação negativa ou como se não fosse compatível com os valores ou com os tempos em que vivemos.

Recentemente ouvi uma entrevista com Luis Von Ahn, fundador e CEO do Duolingo, uma start-up que revolucionou o modelo de aprendizagem de línguas. [Aliás, se você não está usando o Duolingo para aprender mais um idioma, faça um favor a si mesmo e tome logo uma providencia.] Ele dizia algo mais ou menos assim:

Construir uma organização é difícil. Quando você funda uma start-up, não há estrutura, não há hierarquia, não há gerentes e tudo parece ótimo. Infelizmente isso não funciona depois de que você tem uns 25 funcionários. Você simplesmente precisa de uma estrutura e parece haver uma alergia ao assunto nas start-ups.

Essa “alergia” não é exclusividade das start-ups e o problema é que ela pode deixar excelentes empreendedores e executivos um tanto suscetíveis a modismos, que desfrutam de um campo muito fértil quando o assunto é gestão (dieta e alimentação vêm logo em seguida). Então é natural que “novas” formas de organização surjam, recebam atenção e desapareçam de tempo em tempos. Modismos de gestão servem muito bem aos objetivos de seus propositores – vender livros, revistas, credenciamentos, palestras e consultoria – mas não oferecem valor real para as organizações.

Hierarquias gerenciais não são a melhor forma de organizar o trabalho de centenas ou milhares de funcionários para a realização de um propósito; são a única forma.

Enquanto isso, o fato é que hierarquias gerenciais não são a melhor forma de organizar o trabalho de centenas ou milhares de funcionários para a realização de um propósito; são a única forma. Nenhuma alternativa viável foi apresentada nos últimos anos ou décadas e, ao invés de se concentrar esforços para consertar hierarquias doentes, desperdiça-se tempo para encontrar uma nova forma.

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Recursos Humanos

Recursos Humanos: muito além de prestar serviços

Entre meados e final dos anos oitenta muito se discutia sobre qual deveria ser o papel de Recursos Humanos dentro das organizações. A atividade de RH começava a ser questionada pois o papel do gestor incluía o de “gerente de Recursos Humanos”. Ora, se o gestor é o gerente de RH, para quê então um departamento de Recursos Humanos? No limite do debate, aventava-se até a extinção da atividade. De fato, até hoje algumas organizações parecem procurar o melhor título para a diretoria ou departamento de RH.

Estas discussões atravessaram as décadas. No início dos anos noventa, Hamel e Prahalad1 introduziram novos conceitos, dentre os quais o de ‘core competencies’ (competências essenciais)e o consequente desdobramento no incentivo à terceirização mais intensa de atividades não ligadas diretamente às competências da organização. Nesta ocasião, uma das principais mudanças em RH foi a introdução e intensificação do conceito de ‘consultoria interna’ ou papel do Business Partner de RH, trazendo a reboque a ideia de RH como ‘prestador de serviços’.

Se é que há algum encadeamento histórico, nos anos oitenta, com a revolução da qualidade, o cliente ficou ‘reificado’. Deram-se início as inflamadas discussões sobre ‘estamos, de fato, entendendo as necessidades dos clientes?’ afinal ‘o cliente sempre tem razão!’. O extremo desta última proposição chegou a considerar que o cliente (interno) poderia optar por ‘comprar’ ou não os serviços de RH.

Fato é que o espírito de consultoria interna permeou os anos noventa e a atividade de RH não se extinguiu, apesar de a estrutura continuar parecida. Os clientes internos continuam ‘cativos’ isto é, não compram serviços externos autonomamente. E viramos o século falando de consultoria interna e RH como prestador de serviços. Essa é uma ideia que merece alguma atenção, pois não nos parece fazer muito sentido. Para que toda estrutura interna se a necessidade é definida pelo cliente interno?

O foco em prestação de serviços descaracteriza o papel de RH por diferentes motivos. Um deles é que a atividade de RH deve representar a implementação, a transformação e o cultivo de uma cultura (nova ou não). Esta cultura é guiada por valores e é definida pelo primeiro executivo ou executiva da companhia que, entre outras funções, é o(a) responsável pela cultura desejada na organização. Assim, RH deveria assumir o papel de quem dissemina, monitora e intervém no ambiente de trabalho em direção a cultura desejada, ou seja, assumindo um papel ativo na busca da consolidação da prática de valores.

Há hoje em RH a prática da consultoria interna ou a figura do Business Partner de RH e, em paralelo, uma busca de um “RH estratégico”. Estratégico é, sem dúvida, uma palavra bastante desgastada. O que se entende por um RH estratégico?

Para criarmos um referencial que privilegie o diálogo precisamos de um ponto de partida comum. Por exemplo, Elliott Jaques considera que uma unidade de negócios completa possui cinco níveis hierárquicos máximos e necessários para a condução do negócio. No quinto nível, a Intenção Estratégica, está o responsável pela estratégia e resultados da organização. No quarto nível, o Desenvolvimento Estratégico, estão os responsáveis pelo desenvolvimento estratégico, inovação ou definição de políticas e modelos organizacionais. Nesse nível está o RH, que deve assumir as seguintes atribuições:

  • Desenvolver os requerimentos de pessoal para um plano de sete anos para a unidade de negócios;
  • Considerar os desenvolvimentos organizacionais necessários com base na intenção estratégica;
  • Dar condições para o desenvolvimento dos sistemas de RH: avaliação de eficácia pessoal, capacitação, análise de potencial, tutoria, sistemas de remuneração, relações gerenciais, entre outros;
  • Controlar a reserva de talentos da unidade de negócios;
  • Fazer a manutenção do contato com a política de desenvolvimento, no que se refere às suas competências (em caso de corporações);
  • Recomendar políticas que possam fortalecer a eficácia da liderança da unidade de negócios e promover um clima construtivo;
  • Assessorar o presidente sobre a competência técnica e potencial dos recursos humanos do nível 3, no nível Prática, no qual estão os futuros sucessores estratégicos que poderão trabalhar com a presidência.

Estas questões demandam de RH muito mais do que competências em ‘serviços’. Na realidade, as competências em serviços apenas caracterizarão um RH voltado para a ‘solução de problemas’ os quais, obviamente, estarão girando em torno de ‘como treinar melhor o pessoal’, ‘como resolver questões de reenquadramento salarial’, ‘como melhorar o trabalho em equipe’, ‘como selecionar eficientemente um novo colaborador’, ‘como fazer a avaliação de desempenho’, entre outros.

Numa perspectiva efetivamente estratégica o responsável por RH, no nível 4 (Desenvolvimento Estratégico), colabora com outros gerentes gerais e diretores com o objetivo de manter a gestão e a liderança inseridas na política de RH e na cultura desejada. Esse amplo escopo gera o ambiente favorável para uma ação de RH voltada para assessorar altos níveis de performance (nível 3 – Prática). O parceiros de RH (consultores internos?, não nos parece) colaboram com os gerentes gerais na análise e planejamento dos requerimentos e desenvolvimentos vinculados ao RH na fábrica, filial e departamento. Essa assistência envolverá:

  • Planejamento das mudanças organizacionais requeridas pelo fluxo de trabalho ou tecnologia de produção;
  • Planos de recrutamento, capacitação, transferência ou perda de pessoal a fim de satisfazer os requerimentos mutáveis neste escopo (projetos que consideram entre um e dois anos futuros);
  • Supervisão e coordenação das práticas de RH dos gerentes/pares do nível 3, e da repercussão de tais práticas no clima social e nas relações com os sindicatos;
  • Manutenção do contato com especialistas de RH da unidade de negócio com relação às políticas da corporação sobre os recursos humanos;
  • Supervisão do clima social da fábrica, filial ou departamento, e recomendação de qualquer mudança de políticas ou práticas para melhorar o clima organizacional.

Esta é uma abordagem sistêmica e prevê ‘autoridade’ de ação de RH. Um profissional da área uma vez afirmou: ‘se o cliente não quiser não farei’. Isto denota uma perspectiva muito pequena. Melhor seria influenciar o gestor (não cliente) na direção da cultura desejada e verificar porque não existe uma prática da cultura desejada, se este for o caso. E ainda dar o apoio necessário para que ocorram as transformações necessárias. Se estas práticas não acontecerem, a atividade se resumirá ao nível 2 (Serviço). Porém, isto poderá ser feito também externamente, subcontratando-se os serviços.

Afinal, quem detém o conhecimento em RH? Há especialistas e generalistas. E esta discussão nos remete novamente à questão sobre se atuamos no nível Serviço ou não. Atividades em prestação de serviços requerem domínio profundo de conhecimento. Mas o valor agregado ainda está na solução de problemas. Generalistas em RH? O que isso quer dizer? Que falamos uma linguagem de negócios? Que focamos o ‘todo’? Qual o tamanho do todo? Que somos bons estrategistas? Que conhecemos o negócio do cliente? Ora, isto deveria ser ‘default’ em se tratando de profissionais que alocam seus recursos pessoais para o trabalho com organizações. Temos, sim, que entender que questões gerais e amplas, tais como, gerenciamento, modelos organizacionais, poder, política, processos de tomada de decisão, planejamento, e questões ligadas ao tema gestão, estão muito acima da questão de RH como prestador de serviços.

RH deve ter um papel de influência, uma autoridade definida internamente, uma influência quase normativa nas organizações. E conseguirá isto através da competência de obter o apoio do grupo de gestão em direção à cultura desejada. Este é um desafio, não só brasileiro. Afinal, nas últimas décadas, as grandes transformações na cultura gerencial ou organizacional pelo mundo afora foram conduzidas pelos movimentos do marketing, dos conceitos de gestão total, engenharia e qualidade, e da tecnologia da informação. Terá RH liderado alguma revolução cultural? A postura de “prestador de serviços” obviamente limita esta perspectiva de “criar alguma revolução”. Se presto serviços posso estar me colocando numa postura de observador. Isto enfraquece, diminui a autoridade e não gera força de intervenção.

Acreditamos que neste século o foco está nos valores, além das competências. Vemos que cada vez mais as organizações parecem como áreas de transição para o desenvolvimento profissional, o que irá dificultar a formação de culturas. Mas o número de pessoas que trabalham para algum tipo de organização aumenta em todo o mundo desenvolvido (mais de 90%). E, no longo prazo, o desafio do trabalho organizacional parece ser, entre outros, o de contribuir para que o planeta sobreviva – os recursos se tornam escassos, senão extintos, e a tecnologia sempre evoluiu num ritmo muito mais rápido do que o da construção de valores. Em que direção estaremos construindo uma cultura centrada em valores? Como uma organização pode contribuir, de fato, nesta direção, além do “politicamente correto?” Há uma carência de líderes que enxergam o longo prazo. Há uma carência de lideranças! Assim, a questão para RH transcende, em muito, a escala de prestar serviços. RH terá que direcionar, identificar lideranças potenciais e ajudá-las a dar um passo muito mais amplo do que o da gestão dos patrimônios. Boa sorte para todos nós!

Referências

1. Prahalad, CK; Hamel,G; Competindo pelo Futuro – Ed. Campus (19ª edição) – 2005
2. Jaques, E; Requisite Organization – CasonHall Publishers – 1998

Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

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Cultura, Recursos Humanos

Por que, ainda, “cliente-interno”?

Gosto de refletir sobre os paradigmas e estereótipos com os quais me deparo no dia a dia. Conduzindo processos e ações de desenvolvimento, é muito comum a caracterização das interações que RH, e outras funções de apoio, estabelecem ou definem como sendo o próprio papel, como relações de “prestação de serviços” para “clientes-internos” – o que tem incomodado.

Uma prestação de serviço prevê um acordo comercial e investimentos do cliente e do fornecedor antes, durante e depois. Antes, um fornecedor pesquisa, estuda, investiga, compara, cria, conversa, diagnostica, e desenha algo para o cliente. Durante, na condução do processo, há esforços, julgamentos, o assumir riscos, revisões, recriações, etc. Após, há o compromisso de ter realizado o melhor, ciente de que sempre haverá novas ações e contextos.

Na prestação de serviços no interior das organizações não há um acordo comercial ou uma ‘autoridade’ para avaliar a qualidade do que foi feito, não há o que punir ou outro fornecedor para disputar o contrato. O cliente interno não descarta o fornecedor. Nas pseudorrelações entre o prestador de serviço interno e seu pseudocliente há uma falsa pretensão de que alguém está ‘a meu serviço’ ou que ‘eu devo prestar serviços’ a alguém. Se o meu trabalho estiver a serviço de um outro na organização, isso criará relações assimétricas.

Pode ser que essa tese não seja considerada importante. Afinal, a ideia de ‘prestar serviços internos’ para ‘clientes-internos’ está tão difundida que talvez não merecesse nova reflexão. O que vemos, entretanto, é que o uso desses conceitos cria dicotomias e afeta a cultura organizacional.

Parece haver um consenso de que a organização representa um todo, um sistema orientado para produzir, ‘servir’, atender, alcançar seus objetivos econômicos, sociais e, sendo assim, o ‘cliente’ é sempre externo. Como um sistema complexo, as funções da organização se interdependem e ‘olham’ para fora. O propósito de servir está ‘lá fora’. O que quer que se faça de dentro da organização, deve visar o propósito de continuar servindo, adaptando-se mais e mais, criando novas formas de servir e garantindo a continuidade, a fidelidade e o interesse pelo que a organização faz e poderá fazer.

Nessa linha de raciocínio, uma pessoa, uma área ou um departamento não serve a um cliente interno. Juntos, eles servem ao ‘ambiente externo’. Como cada pessoa que trabalha na organização tem uma função; como cada função está dentro de uma função maior; e como cada função maior faz parte de um desenho organizacional orientado para realizar o propósito, todas essas funções ‘olham’ para o ambiente externo, dominam um conhecimento, uma expertise e assessoram as demais funções internas para um desempenho cada vez mais crescente. Não faz sentido, então, perguntar: ‘como posso servir meu cliente interno? ’, até porque não há cliente interno. Essa não é melhor pergunta, pois define uma postura passiva e sem autoridade em relação ao domínio do conhecimento e do porquê da existência de tal função. Sem o reconhecimento da autoridade de uma função, como RH, não há consequência para uma outra área não aceitar e aplicar todas as recomendações, práticas e serviços disponíveis.

O departamento de manutenção não existe para atender a produção, a manutenção existe para colaborar com o sistema produtivo, por meio de seu know-how. A produção não existe para atender ao comercial. A produção existe para colaborar com o portfólio da empresa e para servir ao ambiente externo. As finanças também não existem isoladamente, existem para dar o melhor equilíbrio possível entre empreender e sobreviver. O comercial não é a ‘estrela’ da organização, faz parte do sistema que ‘olha para fora’ e depende das capacidades internas.

Um dos maiores riscos do ‘clientelismo interno’ é a perda do sentimento de ‘pertencer a um todo’. Uma das manifestações exemplares é o do ‘bode-expiatório’. No momento em que – conscientes ou não – buscamos um ‘bode-expiatório’ interno para responsabilizar sobre o problema, a falha ou o fracasso, perdemos a noção de unidade. Colocamos em risco o potencial da aprendizagem, da tolerância e da solidariedade, além de reforçar o ‘poder’.

A cultura organizacional se mede na prática das interações, nas relações, no modo como expressamos os valores e os praticamos. Aquilo que é ‘visto’ é a expressão da cultura. Evoluir e amadurecer a cultura organizacional envolve clareza de princípios e persistência da prática.

Durante os períodos de crise, a força da cultura organizacional pode se revelar uma aliada poderosa. Na busca de soluções engenhosas, não vamos perguntar ‘quem vai nos servir’, não vamos olhar para os lados e perguntar a respeito do meu fornecedor. Porque, internamente, eu não sou fornecedor e nem cliente de ninguém. Eu pertenço ou não pertenço ao todo. Dos pés ao cérebro. É só.

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Capacidade, Contexto, Estrutura, Liderança

Posicionamento e capacidade de influência do RH no desenvolvimento dos negócios

Queremos refletir sobre o papel do RH com ou sem crise econômica, deixando de lado a questão do RH ser ou não estratégico e focalizando naquilo que nos parece ser essencial e atemporal: o RH influenciando o desenvolvimento de negócios.

Talvez você já tenha ouvido uma frase assemelhada a essa: “aqui na empresa só existem dois tipos de pessoas, as que vendem e as que ajudam a vender”. É uma forma de dizer que as organizações têm propósitos claros e as distintas contribuições das pessoas nos diversos papéis e áreas funcionais, precisam convergir para ele.

Pensemos agora no posicionamento do RH como função dentro da organização. Um dos critérios que utilizamos para compreender esse posicionamento é o de avaliar quais perguntas vêm da alta direção para RH. Isto é, se você está em tal função, que perguntas seu presidente ou diretores fazem para você? Do outro lado, que perguntas os profissionais de RH gostariam que lhes fossem feitas? Cremos que a natureza das perguntas de um lado e de outro dão um claro significado de como a função de Recursos Humanos é percebida em sua organização. Ou seja, a função é vista como parte do desenvolvimento do negócio, do valor a ser agregado para o futuro ou é parte dos sistemas e processos de controle da gestão do presente? E claro, o quanto os profissionais que lideram o RH se sentem preparados para responder a tais questões e mostrar convicção de onde podem agregar valor?

Outra forma de compreender esse posicionamento é mensurar o quanto sua organização está buscando externamente o apoio de outros especialistas para responder algumas perguntas:

  • Se o momento é de crise, onde encontrar apoio?
  • Se a questão é de revisão dos negócios, onde encontrar aconselhamento?
  • Se a questão é de revisão do modelo organizacional e de gestão, onde encontrar orientação?

Qualquer que fosse a pergunta, o RH seria considerado e estaria presente na maneira COMO estas perguntas seriam respondidas?

Essa reflexão foca COMO o RH pode EFETIVAMENTE agregar valor para o futuro nas organizações e nos negócios.

E pensando em grandes contribuições, olhamos para três dimensões que aparentemente estariam sob a liderança e influência de Recursos Humanos:

  • Estrutura organizacional
  • Desenvolvimento organizacional
  • Desenvolvimento das pessoas (ou dos recursos humanos, se preferir essa expressão)

Estrutura organizacional

Este tema é do domínio de RH? Ou seja, Recursos Humanos compreende que estrutura organizacional se refere ao “esqueleto”, ao desenho organizacional de suas funções alinhadas ao propósito estratégico de longo prazo? E se entende, como se aplica nisso?

Afirmamos que é o tipo de complexidade, ou seja, o tamanho do propósito da organização que define a estrutura requerida para viabilizá-lo. Esta reflexão é válida tanto para definir o propósito estratégico, quanto para redefini-lo.

Em momentos onde as empresas vivem turbulência e crises, que geralmente não se limitam a curtíssimos períodos, são consideradas políticas competitivas, revoluções em funções estratégicas, desbravamentos de caminhos não trilhados e PARA ONDE serão destinados os recursos, quase sempre escassos, da organização.

Nesse contexto o RH é candidato a cortes ou a investimentos? E quando saberá da decisão? Se as reflexões e aconselhamentos vierem “de fora”, então Recursos Humanos deixou de fazer parte do desenvolvimento dos negócios. Se as reflexões vierem “de dentro”, então há uma possibilidade de participação e influência nas decisões. Ou seja, qual a oportunidade efetiva de contribuição de Recursos Humanos?

Os momentos de crises requerem ainda mais foco em um desenho de estrutura que favoreça altos níveis de produtividade e eficiência dos recursos internos.

No caso de RH, isso se aplica na relação entre as pessoas, e entre as pessoas e seus trabalhos. Falamos das relações, e não dos domínios específicos de conhecimento de cada área funcional (finanças, vendas, logística, produção etc.). Falamos ainda, das ações possíveis neste domínio da conversação sobre desenvolvimento dos negócios e estrutura organizacional.

O específico para Recursos Humanos é que possua e ofereça o conhecimento para que os principais decisores da organização façam uma reflexão fundamentada sobre a relação entre o propósito e a estrutura necessária. Em termos ótimos, cada negócio operará em um determinado nível de complexidade no modo como encara e estabelece sua relação com o ambiente externo; isto é, o grau de ambição que tem em relação ao mercado aberto, o grau de protagonismo que quer ter junto a clientes, o grau de inovação que procura desenvolver etc.

O desenho da estrutura deve refletir estas ambições. E há um modelo conceitual que oferece fundamentos para tanto. O modelo Work Levels® oferece exatamente esta possibilidade de conversação entre propósito e desenho estrutural com a mediação de RH. Também é parte deste estágio de reflexão os princípios maiores que nortearão o ‘funcionamento’ da organização. Um exemplo é a meritocracia. Muitas empresas afirmam funcionar assim, meritocraticamente. Mas, com uma análise mais aprofundada, você notará que as práticas e sistemas adotados não refletem exatamente este princípio. E Isso nos leva a uma reflexão sobre accountabilities e authorities.

Numa tradução livre e breve explicação, falamos aqui da prestação de contas que um ocupante de cargo é chamado a prestar e as autoridades que ele possui, para executar o seu trabalho.

Reforçamos que estamos falando de importantes aspectos no desenho de um cargo, dentro de uma estrutura alinhada com a estratégia. E um propósito estratégico típico olhará PARA O HOJE e PARA COMO as condições de hoje estão ou deveriam estar sintonizadas com as condições futuras (5 a 10 anos à frente). Essas duas qualidades requerem aprofundamento porque despertarão atenção sobre aspectos importantíssimos tais como confiança mútua, autonomia, uso da iniciativa e alcance de desempenho além das expectativas. 

É nesse estágio que as reflexões sobre a capacidade potencial existente na organização ganharão peso e importância, visando mensurar se existe capacidade potencial instalada para dar respostas aos desafios atuais e aos que virão.

Novamente, quais perguntas estão sendo formuladas para Recursos Humanos? E quais têm sido as respostas?

Desenvolvimento organizacional

Aqui estamos falando do que decorre direta ou indiretamente da ESTRUTURA EXISTENTE. E já sabemos, é melhor que ela seja exatamente aquela que é requerida pelo propósito estratégico.

O desenvolvimento organizacional deve colocar sua atenção nas práticas e sistemas que sustentam as relações entre as pessoas, e entre as pessoas e seus trabalhos.

Ele deve garantir que os princípios gerais, políticas e valores estejam devidamente presentes em sistemas de gestão por meio dos quais as pessoas perceberão coerência nas diferentes práticas organizacionais. São nessas práticas que, por exemplo, “veremos” a realidade da meritocracia, a coerência da liderança gerencial, os sistemas de comunicação e decisão.

Consequentemente, reforçando a essência desse podcast, a função Recursos Humanos pode ser aquilatada em sua contribuição ao desenvolvimento organizacional, pelo tipo de prestação de contas e pelas autoridades correlatas que lhe são atribuídas e pelo grau de reconhecimento interno com relação ao uso efetivo de tais autoridades. Sem tal clareza de prestação de contas e autoridades e sendo reconhecido exclusivamente por suas interfaces internas, Recursos Humanos continuará sofrendo de crise de identidade e sua contribuição para o desenvolvimento dos negócios não será percebida como coerente e sintonizada com o propósito. 

Desenvolvimento das pessoas, ou dos recursos humanos 

Os investimentos em tempos de crise se tornam escassos. Mas há alguns princípios que por si só ajudam a gerar efeitos no desenvolvimento das pessoas. Elliott Jaques nos ensinou que “mudando a estrutura mudam-se os comportamentos”. Exemplificamos que combinando-se o desenho (ou redesenho) organizacional com princípios meritocráticos, e com clareza de prestação de contas e autoridades, esse novo ambiente mobilizará os recursos (latentes) das pessoas.

O entendimento sobre a natureza humana e trabalho aqui aplicado é bem simples: as pessoas buscam realizar seu potencial num trabalho que lhes seja significativo. São poucos os que querem ser CEOs, mas ninguém quer ver suas capacidades subaproveitadas e sem espaço para mostrar seu potencial de realização.

Essas crenças estão presentes nos sistemas que são praticados?

Daí decorre um segundo princípio que é o desenhar funções onde as pessoas possam experimentar flow. Dito de maneira simples, flow representa uma atitude energizada, intrinsecamente motivada e voltada a realizar, que emerge quando os desafios exigem o melhor de nossas capacidades, num trabalho que valorizamos fazer. Coloque as pessoas em flow e novos resultados aparecerão!

Sendo assim,

é ponto de atenção de Recursos Humanos o conhecimento da capacidade potencial das pessoas, para que possam aplicá-las de forma consistente, em FLOWE aqui não estamos falando do seu perfil comportamental ou tipo psicológico. Outro não menos importante é conhecer e promover as habilidades gerenciais para dirigir, guiar e trazer as pessoas para a governança das ações da área ou departamento.

Novamente, aqui, na identificação e transformação do potencial em desempenho, é possível observar o grau de coerência entre propósito, valores e sistemas de gestão.

E quanto ao treinamento?

Gestores capacitados e que valorizam pessoas conduzirão os próprios processos de coaching (o que é um accountability gerencial). Forme gestores como coaches, caso eles não saibam como fazer, e eles cuidarão do resto!

Finalmente, o que aparece em muitas empresas é que Recursos Humanos parece buscar agregar valor valendo-se do paradigma do “administrador” (como oposto às ciências das pessoas).

A etimologia da palavra talvez ajude a (re)encontrar um significado. Administração vem do latim “admnistratio, ónis”. Um dos significados é que se trata da ação de prestar ajuda. “Ad” vem de agregar, significa aproximação, como “addgregare” que significa “juntar todo o rebanho”. Assim, ao pensar em agregar valor pense: “em todas as ovelhas que compõem o rebanho chamado valor”.

Assim, RH poderia fugir da pura aplicação do termo “administração” como gestão, com o risco de repetir paradigmas puramente “administrativos”.

Mas, no caso de RH, gestão do que? As pessoas estão sob liderança dos gerentes.

Agora tomemos a palavra “manager” – separando “man” e “ager”. Teremos um significado tal como o homem que faz o outro crescer (ager). Então, o gerente é que “gera”, agrega valor ao crescimento das pessoas.

E Recursos Humanos precisa se ver com a prestação de contas e com autoridades formais e equivalentes para que a “ajuda” ou o “valor agregado” esteja na interface entre gestores e pessoas, atuando para que as práticas organizacionais sejam coerentes com o propósito e os requisitos da natureza humana no trabalho.

É nessa interface que as coisas acontecem, onde o propósito organizacional se realiza, onde as políticas são percebidas e os valores praticados.

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Autodesenvolvimento, Carreira

Coaching ou Counseling? Uma leitura sistêmica

As comparações que faremos a seguir das atividades de coaching e counseling consideram e se restringem ao contexto organizacional, onde as funções gerenciais possuem contornos específicos.

coaching é uma atribuição gerencial e a ela se associa papel similar ao papel do técnico esportivo, o coach. Sua ação envolve não apenas o domínio técnico como também o comportamental, atitudinal e de competências dos liderados. É uma atribuição não-delegável para alguém externo, pois o coach se compromete com o desempenho e com todos os fatores que o afetam.

Voltaremos a isso daqui a pouco e antes, gostaria de dizer que de acordo com Gillian Stamp, existem três atividades gerenciais essenciais, que articuladas resultam numa prática ótima:

  • Tasking (atribuir responsabilidades)
  • Trusting (confiar no julgamento)
  • Tending (nutrir o desenvolvimento)

Figura 1 – Tripod of Work

Entenda-se aqui que essas atividades são comportamentos de um líder gerencial na relação com as pessoas de sua equipe. E são carregadas de importantes intencionalidades.

  • Por meio do tasking, a liderança expressa o que deve ser feito, estabelecendo o quê deve ser feito, para quando e com qual padrão.
  • Pelo trusting, a liderança confia a uma pessoa o uso de suas habilidades e julgamentos para realizar o trabalho.
  • tending é monitorar sem interferir, checando os recursos, prioridades e o progresso do trabalho.

O que acontece quando essa prática está ausente ou não é aplicada de forma ideal?

Provavelmente as relações líder-liderado estarão marcadas ou pela rigidez ou pela difusão. Pela sua rigidez a liderança gerencial exercerá demasiado controle, agindo por meio de pressão, desconfiança e policiamento e isso traz, como consequência, uma grande dose de frustração, paralisia e até alienação. Pela sua difusão na forma de atribuir tarefas a liderança gerencial renuncia a seu papel de delegar corretamente transferindo essa responsabilidade ao subordinado. A consequência é que as pessoas são afetadas de forma a tentarem adivinhar o que se espera delas, surpreendem-se posteriormente com avaliações de desempenho e o líder é visto como uma incógnita.

Agora, vamos pensar num determinado contexto para continuarmos nossa análise.

Imagine que você é um gestor e que o seu líder imediato o está avaliando. E ainda, que a conclusão dele é que você não consegue obter o melhor de seus liderados.

Aqui você também se perguntará: por que meus liderados não alcançam os objetivos atribuídos?

Isso certamente emoldura uma situação onde você, como gestor, não está agindo como o coach dos seus liderados e, portanto, eles não estão realizando plenamente o que poderiam realizar.

É bem razoável imaginar que pessoas de sua equipe não estejam bem capacitadas e que resolver isso, exigirá que você se envolva diretamente para garantir que elas possuam conhecimentos e habilidades suficientes. Pode implicar ainda na revisão de certos comportamentos seus, como líder, que possam estar afetando o bom uso do julgamento por parte das pessoas de sua equipe, resultando na má utilização de recursos para alcançar os objetivos.

Penso que deixamos claro que o coaching é uma responsabilidade gerencial porque não exime o gestor como parte do problema.

Senão, vejamos.

Ao contratar uma pessoa para a liderança gerencial, a empresa confia a ela um grupo de pessoas, e espera que sejam conduzidas dentro de princípios que favoreçam o crescimento mútuo na busca dos objetivos, formando uma equipe criativa e receptiva à liderança. De sua parte, a pessoa contratada, aceita assumir o grupo e assim dedicar parte do seu trabalho no balanceamento de seu tempo entre certas funções específicas e a coordenação de pessoas. É algo indissociável na função gerencial e se isso não acontece, onde está a causa desse problema? Respondemos que está na ausência ou precária demonstração das atividades gerenciais denominadas anteriormente como Tasking, Trusting e Tending.

Podemos fazer a pergunta para o gestor. Mas também podemos fazer a pergunta para a organização, olhando para as suas políticas de desenvolvimento gerencial. Desenvolver o liderado sempre envolve desenvolver a liderança gerencial.

Por exemplo, como a organização declara o que se espera dela?

Como a organização declara que o gestor é o responsável pelo output de seus liderados?

Portanto, a liderança  precisará de coaching quando suas habilidades não garantem as práticas gerenciais esperadas. E uma pessoa que lhe é subordinada, precisará de coaching quando suas habilidades em geral (para coisas e pessoas) não corresponderem ao tamanho de um determinado desafio que lhe é proposto.

 Agora vejamos algumas circunstâncias típicas que demandam do líder esse papel de coach.

  1. Ocorrerá nos trabalhos de indução de um novo colaborador, para facilitar a compreensão do contexto de trabalho. A autoridade gerencial legítima é um fator psicológico importante na relação que se constrói entre líder e liderado. Existem expectativas mútuas fortes. Um gerente contrata alguém para compor a sua equipe, que, por sua vez, tem expectativas sobre o novo membro. A pessoa contratada espera fazer parte de um grupo e parte do sucesso é ter um papel claro e reconhecido por todos os membros do grupo. Em última análise, um gerente trará para sua equipe um novo colaborador porque será capaz de confiar nele.
  2. Ocorrerá sempre, constantemente, como uma atividade de nutrição do desenvolvimento dos liderados, para que eles definam os melhores caminhos para alcançar as responsabilidades que lhes foram atribuídas. Este é um ponto sutil, pois envolve COMO o conhecimento é aplicado. Não se trata apenas do domínio técnico, mas também comportamental, no sentido de que todo comportamento está impregnado de valores. Cabe ao líder gerencial dizer os PORQUÊS, O QUE e o PARA QUANDO, ou seja, estabelecer as metas esclarecendo contextos e propósitos. E ainda, na medida em que cada situação requisitar, dialogar sobre COMO os planos apresentados serão conduzidos.
  3. Ocorrerá quando algo, em especial, não vai bem. Quando um liderado não consegue resolver problemas e ‘entregar’ o que é esperado, o gerente intervém e sua ação é a de compreender o que afeta o desempenho. Um desempenho ineficiente é de responsabilidade da liderança. Um líder deverá discernir quando um desempenho ineficiente tem causas em variáveis que pode lidar ou quando o problema demandaria a ação do counselor. Opa, aqui começamos a falar de aconselhamento. O processo de counseling requer pessoas especializadas em alguma dimensão e envolve questões comportamentais que transcendem as habilidades gerenciais. É importante reforçar que o aconselhamento transcende o papel do líder coach e, quase sempre, é feito por pessoa externa à organização.

Então, o que é mesmo esse Counseling?

Observe que quando um gerente sente que não pode lidar com aspectos que envolvem transcendem sua ação de coach, poderá ter o apoio de um counselor.

Trabalhos de  aconselhamento envolvem a colaboração mínima entre 3 pessoas que exercem os seguintes papéis: a liderança gerencial, a pessoa em foco, e a pessoa que fará o aconselhamento. É a ação integrada para tratar de questões que a ação gerencial não tem dado conta. Em geral envolvem aspectos comportamentais, motivacionais ou de outra natureza que não a de conhecimentos especializados. Um counselor não tem conhecimento específico, técnico, que afeta o desempenho. Essa variável cabe ao líder coach. O aconselhador poderá ter extremo valor para o gestor e liderado por captar outras variáveis e orientar ações pertinentes. questões que afetam o momento. Nesse sentido, o aconselhamento pode abranger tanto o liderado quanto o próprio líder, uma vez que foi escolhido ou aceito como facilitador de reflexões sobre a carreira e o desempenho, sobre o impacto de novas decisões, ou quando novos insights são necessários.

Também existem algumas circunstâncias típicas que demandam o aconselhamento externo

  1. Quando os profissionais estão fora de flow (Fig. 2), isto é, existem tensões evidentes na relação entre as pessoas, ou aquelas decorrentes da insuficiência de suas capacidades para lidar com as demandas do ambiente. Tensões no sentido de decisões adiadas, perdas com custos ou desperdícios, algum tipo de sofrimento, por stress, por apreensão mais profunda. Também, quando forte apatia e mau uso do julgamento estejam presentes. Pessoas fora de flow, em geral, refletem alguma distância entre complexidade do trabalho e a sua capacidade.

Figura 2 – Flow, a experiência no trabalho

  1. Quando há conflitos no campo dos valores e das expectativas. Em geral envolvem questões que afetam novas decisões em torno de carreira, futuro e melhor uso das capacidades potenciais.
  2. Novas decisões estão sendo procuradas por parte da pessoa. Isto pode refletir um momento particular, onde as questões estão além do desempenho.
  3. Pode haver questões comportamentais específicas, como lidar com particularidades da própria personalidade, tais como agressividade, egocentrismo, arrogância, inacessibilidade, interferência, que podem ter causas numa dimensão pessoal, nem sempre acessível ao gestor.
  4. Quando um conhecimento especializado é fundamental para reverter um padrão comportamental.
  5. Quando alguém, devido a uma promoção, pode não antever ou compreender especificamente o escopo de seu trabalho.
  6. Quando novas decisões de carreira estão sendo consideradas.

O gestor é fundamental no desenvolvimento de sua equipe. Porém, há casos em que o gestor não tem as habilidades de coach. É uma oportunidade interessante para que alguém externo faça o aconselhamento e desenvolva as habilidades de coach fazendo com que estes completem suas de habilidades.

Formar a liderança em processos de coaching potencializa os resultados do papel gerencial. A dependência de uma assessoria externa para substituir o líder no seu papel de coach, não e saudável. O líder gerencial pode não ter habilidades específicas. Mas isto pode ser desenvolvido. Porém, é contra a natureza essencial do gerenciamento retirar do gestor a responsabilidade por este papel.

Do ponto de vista do liderado, ações combinadas de coaching e counseling podem ter alto valor agregado. Enquanto o coaching busca reverter as dificuldades de desempenho, o counseling facilitará o desenvolvimento de insights, expandindo a consciência do aconselhado para que ele encontre e utilize os seus recursos na direção necessária.

Muitas vezes, questões de desempenho são explicadas e superadas por reflexões acerca da história pessoal e por sua contextualização em novas perspectivas, favorecendo novas escolhas. Uma visão retrospectiva, como também uma contextualização em relação ao futuro farão enorme diferença.

Nesse aspecto, o Pieron tem uma atuação diferenciada no mercado, pois os aconselhamentos que promove consideram dentre outras coisas o diálogo sobre estimativas de capacidade potencial futura, ou seja, olhando o longo prazo.

Em geral, as pessoas durante os aconselhamentos mostram que conhecem muito bem suas competências. Porém, pode faltar-lhes perspectiva ou recursos para uma reflexão motivadora acerca do tamanho de ambiente em que querem atuar e com qual grau de turbulências estarão confortáveis. Sempre há aprendizado importante durante esses trabalhos.

Ninguém muda caso não queira. Coaching e counseling estão fundamentados num profundo interesse e respeito entre as partes. Tudo isso tem a ver com mútua aceitação. Implica em confiança recíproca e ausência de manipulação ou instrumentalização das relações.

Esse é o grande desafio para a eficácia dos trabalhos de coaching e counseling: assentar-se em bases de confiança mútua e possibilidade de crescimento.

Referências: Stamp, Gillian. Material interno do Bioss International e Instituto Pieron. Maturana, H; e outros. Formação humana e capacitação.

Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

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Liderança

Você é um gerente de verdade?

O que define um gerente?

Antes de responder, preciso tratar da questão dos Gs para evitar possíveis confusões.

Gerente com G maiúsculo nada mais é do que um título, tal como Coordenador, Diretor, Analista ou Vice Presidente. Títulos servem para representar em qual estrato organizacional uma determinada posição está e qual é a sua função.

Quando falo de gerente, com g minúsculo, me refiro à propriedade de uma determinada posição. E é dessa propriedade que quero tratar neste post.

Então, o que define um gerente?

Vamos lá: a característica mais marcante de uma posição gerencial é que seu ocupante (o gerente, também conhecido como gestor) será pessoalmente responsabilizado, não apenas por sua própria eficácia, mas também pelo resultado do trabalho dos seus subordinados. Ninguém quer gerentes que deem com os ombros ou transfiram a culpa para seus subordinados quando a coisa fica feia.

Vou para por aqui com os negritos nos Gs. O ponto já foi feito.

Agora vem o pulo do gato: para que um gerente possa ser responsabilizado, de forma justa, pelo resultado dos seus subordinados, ele precisa de algumas autoridades mínimas. Sem essas autoridades, inicialmente observadas e listadas por Elliott Jaques, não se pode dizer que tal posição é gerencial ou que o seu ocupante é um gerente:

  • Vetar a seleção: Se eu, como gerente, serei responsabilizado pelo trabalho dos meus subordinados, não posso ser obrigado a aceitar alguém que não acredito ser adequado para o trabalho. Isso não significa que possa sair contratando qualquer pessoa a meu bel-prazer, já que normalmente existem políticas organizacionais que tratam do assunto. Mas, de qualquer forma, eu tenho que ter veto para ser chamado de gerente.
  • Atribuir tarefas: Se eu, como gerente, serei responsabilizado pelo trabalho dos meus subordinados, somente eu posso definir, priorizar e alocar o trabalho entre eles.
  • Reconhecer, revisar e remunerar o desempenho de forma diferenciada: Se sou eu, como gerente, que atribuo tarefas aos meus subordinados, somente eu posso julgar e reconhecer (dentro das políticas aplicáveis) sua eficácia na realização do trabalho. Sim, isso inclui avaliação de desempenho, remuneração diferenciada, remuneração variável e qualquer outro sistema que envolva reconhecer, revisar e remunerar. É claro que existem políticas para isso, mas, dentro de tais políticas, a decisão tem que ser minha.
  • Iniciar remoção da posição: Da mesma forma que eu, como gerente, tenho autoridade para vetar a seleção de qualquer pessoa para a minha equipe, tenho que ter a autoridade para iniciar a remoção de alguém que acredito não estar mais à altura do trabalho. Notem que isso não quer dizer demitir alguém de uma organização, já que podem existir políticas de realocação interna antes que uma demissão seja realizada.

Lógico, não é? Mas nem sempre é isso que encontramos no mundo real. Veja algumas lamentações bastantes comuns:

  • Não posso mais decidir sobre a avaliação de desempenho dos meus subordinados. Agora estão usado uma avaliação 360 graus para isso. Dizem que assim as avaliações ficam mais justas” – Aqui o gerente se tornou apenas mais um a julgar o desempenho dos seus subordinados. Aberrações, como ter um subordinado julgando o desempenho do seu gerente, não são incomuns no mundo real.
  • Meu chefe me fez aceitar um novo Analista na minha equipe. Ele foi indicado por um conhecido dele. Eu disse que não achava um boa escolha, mas não teve jeito” – Como que o gerente, neste caso, poderia ser responsabilizado pelo desempenho deste subordinado?
  • Meu Diretor foi falar diretamente com um Coordenador da minha equipe e disse para ela parar tudo que está fazendo pelas próximas duas semanas para focar num outro projeto” – Aqui fica bem claro que o Gerente em questão não é o gerente de fato.

A pergunta mais frequente que se segue é a seguinte: “Mas isso não é poder demais nas mãos dos gerentes“?

Diria que não.

Essas autoridades são as mínimas, necessárias e suficientes para que os gerentes possam, de fato, ser responsabilizados e cobrados pelo desempenho das suas equipes. Sem desculpas. Sem chororô. E vale lembrar que todo gerente (exceto o Diretor Presidente ou equivalente) é subordinado a outro gerente e, portanto, deveria ser responsabilizado pelo bom uso das suas autoridades.

Sem autoridades claras, não há treinamento de liderança que dê conta do recado.

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Autodesenvolvimento, Carreira

Gerações, Gestão, Criatividade e Inovação

Um dos temas sempre presentes na gestão de RH tem sido o das gerações, suas diferenças e potenciais conflitos entre elas. Pergunto-me se há uma espécie de contraponto a isso. Como esta questão é tratada principalmente realçando diferenças, olhando-se retrospectivamente pode-se identificar padrões constantes que trazem outras maneiras de abordar o tema.

Por exemplo, em Mind Set, Naisbitt discute o tema ‘mudar e mudanças’ na perspectiva do que muda efetivamente e o que permanece constante.

Sob o impacto da mídia, a nossa sensação de que tudo muda rapidamente está definida e sustentada pelos distintos meios de comunicação e relacionamento, além de inúmeras publicações. De outro lado, acompanhando Naisbitt, muito permanece constante.

A maioria das empresas ainda permanece estável; Amazon já passou dos 20 anos, e vem junto Facebook, Google, Apple é ainda mais longeva, além de marcas centenárias. Casas, carros e roupas inteligentes já estão por aí…

Mas, pergunta Naisbitt, estamos fazendo apenas de modo diferente, com mais alcance, com mais qualidade aquilo que já fazíamos antes?

E ainda, qual é a essência deste viver que aparenta constante mudança?

Vamos à escola, casamos e temos filhos que vão à escola, fisicamente ou à distância, escola esta que, sabemos, pouco muda (apesar dos apelos às reformas).

Casa, lar, família, trabalho, escola, saúde, lazer, relacionamentos afetivos, amorosos, continuam os mesmos. Filhos continuam tendo dificuldades com os pais, líderes e liderados continuam tendo problemas de relacionamento, o stress continua no trabalho.

Menores continuam se engravidando, meninas ainda sonham com príncipes, jovens querem novidades. Pessoas vão a templos religiosos, compram carros, roubam, matam, drogam-se. Ídolos da juventude continuam a morrer de overdose. Trabalhamos como sempre trabalhamos.

A vida nas fazendas pouco mudou, mas se modernizou; as estações determinam o ritmo da vida ali, agora com equipamentos e tecnologias eficientes. Enfim, há que se pensar nas mudanças em termos “do que muda’ e do ‘como muda’.

Gerações

Nesta linha de raciocínio, pergunto-me pelo que há de comum ou constante entre as gerações e as mudanças no QUE ou no COMO.

É comum entre as gerações, a necessidade do jovem questionar, mostrar-se ‘DIFERENTE’ e avançado em relação a seu tempo. Os valores anteriores já não servem mais. A busca de autoafirmação se dá contestando o que está estabelecido. Mas é comum, por exemplo, a atração pela tecnologia em todas as gerações. Nós nos deslumbrávamos com a geladeira nova nos anos 50, assim como com a luz elétrica anos antes. Os jovens dos anos 60 trouxeram o valor de uma juventude menos reprimida e socialmente engajada.

Então, é comum que a geração atual questione a anterior, como também será questionada pela posterior.

É comum que cada geração produza aquelas poucas (muito poucas) transformações dos padrões comuns das nossas vidas, com inventos, novos conceitos, novas filosofias, novos negócios. Mas, considerando-se os bilhões de humanos que somos, sempre foram – e provavelmente serão poucos, muito poucos – aqueles que transformam padrões sociais amplos.

Mas, é padrão de cada geração produzir rupturas nos ‘COMOS’ e nos “O QUÊS” por meio daqueles poucos, que acabamos elegendo como nossos referenciais, modelos ou líderes ideais.

Os “O QUÊS” de nossas vidas e trabalho continuam parecidos, na essência do que fazemos. Sempre trabalhamos…

Por mais que procuremos mudar as organizações com fortes críticas aos padrões ‘hierárquicos’, o que fazemos é contestar as relações de poder. TODAS as gerações fazem isso.

As empresas admiradas atualmente são hierárquicas, mas com outros valores de relações pessoais: elas melhoraram o “como”. Entretanto, continuamos a trabalhar em organizações hierárquicas, O ÚNICO MODO de organizar o trabalho que o ser humano conseguiu produzir, há mais de 2.000 anos.

As novas tecnologias provocaram grandes mudanças. Mas todas as gerações sempre ansiaram por novas tecnologias, novos ‘COMOS’para melhorar e ‘modernizar’.

O que mudou de uma geração para outra não seria, de fato, mudanças no COMO se faz – ao invés de mudanças essenciais no QUE se faz?

Vimos mudanças essenciais no FAZER das chamadas gerações X, Y, Z, ou quaisquer outras?

As novidades observáveis são mudanças na forma “COMO” nos movemos, “como” compramos, “como” nos comunicamos, “como” aprendemos ou estudamos.

Os velhos e os antigos de hoje, foram os jovens do passado. Os jovens de hoje, serão os velhos e os antigos do futuro.

Seria um erro julgar o futuro com os valores de hoje, pois as próximas gerações trarão os mesmos padrões de críticas das gerações anteriores.

Pensando em tudo isso, qual seria o impacto para a gestão de gerações?

Se é esperado que uma geração entrante vá mostrar padrões previsíveis, tal como questionar a geração anterior´, então, procuremos refletir sobre alguns pontos, sobre outros critérios.

  • Velocidade e ambição de rapidamente crescer na carreira? Não creio que todas as pessoas, de qualquer geração, tivessem ou tenham a ambição de serem CEOs. Não creio que os mais jovens entrantes possam ser rapidamente conduzidos a tomarem decisões estratégicas e conduzir o futuro de um negócio. Alguns, sim, mas poucos. Afinal, a maioria das start-ups morrem cedo.
  • Equilíbrio entre vida pessoal e profissional? Aí está um valor pelo que vale a pena brigar. Será novo? Um novo ‘o que’ ou um novo ‘como’? Mais ócio criativo? Mas, quem organizará a sociedade para garantir tudo isso? Talvez os jovens aspirem a menos “emprego” e mais “trabalho”? Mais autorrealização? Sim, há uma potencial mudança para o “como”, mas como mudar A ESSÊNCIA da vida produtiva, do trabalho?
    • Tenho conhecimento de jovens da geração Y ou até Z, que já trabalham 12 horas por dia.
  • Hoje, a adolescência está se estendendo, em casos até os 30 anos; tende a ser um padrão de jovens que preferem viver em casa: o quarto é o habitat social alimentado pelas redes. É uma mudança no o quê? Esses será o novo padrão da vida social? Difícil dizer que sim. A vida sem relações sociais não parece ter muito significado.
  • A tecnologia parece estar criando um outro tipo de padrão de convívio familiar e a necessidade de questionar os “mais velhos” toma a forma de uma rebeldia dos filhos contra os, que querem que seus eles saiam dos seus quartos e da tela de acesso “ao mundo”, agora virtual. Mantém-se o “como” atualizado para o século XXI?

Olhando através das muitas gerações e o mundo que foi construído por meio do trabalho, aparentemente fomos competentes em lidar com as diferenças. ‘Novos’ sucederam os ‘velhos’, os velhos deixaram legados e os novos de então outros legados. Se a nova geração expressa ansiedade por se afirmar e abrir espaço para suas necessidades, isso não é novidade, sempre aconteceu.

No final da década de 60, estudantes se organizavam para contestar. Hoje, a facilidade da comunicação eletrônica pode tornar esta atitude ainda mais intensa, senão poderosa. O que mudou?  Apenas o “como”.

Se há resistências de uma geração para o que é apresentado pela nova, é importante ressaltar que resistência a mudanças sempre fez parte das relações entre grupos: mesmo entre jovens existe a intolerância, a não aceitação das diferenças…

Organizações se debatem com a constante “gestão da mudança”, com a necessidade de serem criativas e inovadoras. A competição sempre foi uma constante na vida organizacional.

Não há a meu ver, uma NOVIDADE na busca do vamos criar, vamos fazer diferente, etc, que a nova geração parece trazer, até porque mudança e necessidade criativa são padrões humanos. E falando novamente no contexto organizacional, incerteza e imprevisibilidade sempre foram os pressupostos e contextos para a liderança gerencial.

Aqueles que criaram rupturas criaram novas bifurcações, novos ‘o quês’, que afetam e afetarão as atuais e as novas gerações.

Mudança é um padrão constante; há que se viver com ela. Novos ‘comos’ devem ser bem-vindos e o ambiente organizacional deveria estar sempre preparado para surpresas, novidades, rupturas, readaptações. Nem sempre é o caso, mas isto também é uma constante, e independe de qual é a geração. Grande parte das organizações sobrevivem por décadas, e sempre conviveram com os conflitos de gerações.

Mundo aberto e em transformação é matéria-prima para inovações e elas vêm pela intuição de poucos, que criam tais rupturas. Quem são as pessoas da geração atual que farão isso? Que farão os rompimentos com O QUE se FAZ atualmente?

Não nos parece que mais “Facebook”, “Twitter”, “Google”, “Uber”, “Deliveries”, sejam de fato soluções criativas.

As organizações estão trazendo para dentro de si personagens estereotipados das mudanças no COMO FAZER ou estão identificando talentos capazes de reorganizar e redefinir o QUE FAZER, de redefinir PROPÓSITOS?

Como voltamos a falar de talento, vamos pensar um pouco na sua demografia e escassez.

Demografia do talento

A disputa por ‘talentos’ sempre foi uma constante através de todas as gerações. A arte de os atrair e manter também é uma constante, variando apenas o COMO FAZER, sempre adaptados aos contextos e condições atuais.

Em geral a criatividade está nos ‘comos’, pois podemos reorganizar e recombinar as coisas, os conhecimentos e as práticas.

A inovação – e algo da genialidade – está no rompimento com os ‘o quês’. Claro, numa organização talvez não precisemos de ‘Einsteins, Galileus ou Newtons’. Não creio que estas “genialidades” sejam atributos específicos de alguma geração. Contudo as novas gerações terão desafios globais ainda mais significativos, pois os impactos das ‘grandes decisões’ atuais (governos, tecnologia, iniciativa privada e grupos sociais) afetarão sobremaneira não mais a relação específica entre um líder e um liderado em si, mas nos exporão a questões que exigirão grandes rupturas nos ‘o quês’. Saltos qualitativos nos padrões de questionamento dos ‘o quês’ serão muito bem-vindos, até porque podem representar a continuidade saudável dos conflitos entre gerações.

A escassez dos talentos

Sempre foi uma constante. Elliott Jaques nos dá uma ideia disto pela extrapolação de seus estudos longitudinais sobre capacidade potencial, ou seja, o uso do julgamento e discernimento em condições de incerteza (fig.1).

Enquanto as novidades DAS FORMAS trazidas pelas novas gerações referem-se a novos valores e comportamentos, os desafios de conduzir negócios alinhados com a realização de seu propósito estratégico, demandarão capacidades que poucos trarão. Capacidades como visão corporativa, de sociedades emergentes, condições ambientais, mercados futuros, novos valores para as próximas gerações. Uma visão pessimista? Não parece ser.

Não é incomum a sensação de que estamos com lacunas de lideranças. Na sociedade e nas empresas. Igualmente para as organizações locais, a escassez é uma realidade que deve ser encarada não apenas sob olhar educacional ou das especialidades. A condução dos negócios por meio de uma liderança focada em capacidade humana, e menos em tarefa, é escassa. A gestão e busca do talento é uma realidade com limitação demográfica – e os processos seletivos não deveriam confundir habilidade criativa com capacidade inovadora.

Na perspectiva de Elliot Jaques a capacidade potencial, sendo o uso do julgamento e discernimento, não é treinável. Por isso mesmo, é um fator de desequilíbrio qualitativo importante, que pode significar ganhos em competitividade. É esta capacidade de julgamento e discernimento que tem a ver com o antever, ‘enxergar’ caminhos à frente, explorar a ausência de conhecimento, pois o conhecido é acessível a todos.

Parece óbvio que isto tem que ir além dos questionamentos em relação aos ‘comos’ e prosperar por meio de novidades disruptivas com os ‘o quês’. É a questão empreendedora, que transcende e atravessa as gerações.

Nesta perspectiva, bem-vindas as novas gerações que continuam a gerar a constância das mudanças significativas, assim como fizeram todas as outras.

É necessário cuidar para não limitar as expressões das gerações atuais, de forma que as repetições das resistências não impeçam o florescer dos novos talentos. Dessa forma, é preciso investir no semear caminhos para que aqueles significativos poucos possam produzir mudanças qualitativamente transformadoras.

As novas organizações deveriam se inspirar nos princípios de Organizações Generativas, tendo como um de seus pilares formar e cuidar das próximas gerações.

Figura 1


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Autodesenvolvimento, Capacidade, Carreira

Desempenho pessoal – cognição, emoção e flow

Os fatores ‘internos’ do desempenho são dependentes da pessoa, e são tratados segundo seus ‘recursos’, os quais, por sua vez, seguem o ponto de vista de seus “departamentos”: inteligência, emoções, aspectos ‘herdados’ – filogenética e ontogenética.O tema ‘desempenho pessoal’ é tratado de maneira desigual por diferentes linhas e pode ser didaticamente compreendido em duas categorias: fatores ‘externos’ e fatores ‘internos’. Os externos abrangem condições como ambiente, liderança, aspectos estruturais e contextuais da organização ou do negócio. Nosso interesse aqui é destacar os ‘fatores internos’ da pessoa, sem deixar de fazer considerações sobre os fatores ‘externos’.

A primeira compreensão do desempenho e do comportamento dividia as funções psicológicas em três categorias: emoção, conação ou vontade, e cognição (ou inteligência e raciocínio). Posteriormente, a Psicologia passou a usar vários dos sistemas de um organismo para fazer referência a diferentes áreas de desempenho: sensação, percepção, memória, emoções, inteligência, pensamento, imaginação, criatividade, cognição, necessidades e também personalidade. Uma terceira orientação, da psicanálise, construída por Freud, descreve um sistema dinâmico de relação entre ego, superego e id, e suas partes funcionais: consciente, pré-consciente e inconsciente. Depois de Freud o Homem já não mais é visto como plenamente consciente e racionalmente dono de si e de suas ações.

Desdobramentos mais recentes descrevem nossas mentes por entidades específicas e independentes, como inteligência emocional, diferentes inteligências como matemática, verbal, interpessoal, intrapessoal e competências.

O movimento das competências trouxe o questionamento sobre o Q.I. A neurociência tenta compreender o cérebro e suas funções. A inteligência emocional trouxe uma percepção sobre a importância das relações interpessoais, a estabilidade emocional e o autoconhecimento. As competências libertaram o julgamento sobre as pessoas das amarras do currículo e da escolaridade. Nenhuma das linhas, porém, define especificamente a capacidade do organismo (pessoa) para o trabalho (Jaques, 2002). A dicotomia entre cognição e emoção ainda persiste, em paralelo à visão do organismo como um todo, isto é, integração entre biologia e mente. Também há, ainda, aqueles que entendem que ‘inteligência emocional’ é a chave dos problemas de desempenho. Entendemos que não. A compreensão do ‘organismo como um todo’ requer mais do que encontrar as ‘partes’. Vamos acrescentar mais alguns pontos.

O que é trabalho humano? Trabalho humano é definido por Jaques (1996) como ‘o uso do julgamento e discernimento na produção de escolhas e tomada de decisão na busca de realização de uma intenção, um objetivo, que está definido num tempo futuro’. Para Jaques, a capacidade ‘trabalho’ varia de pessoa para pessoa. Cada um estará mais confortável com determinados horizontes de tempo para a realização de projetos. O humano é um ser sempre em ‘locomoção’, intencionado, orientado para o futuro, definindo metas, objetivos e projetos. Isto define a capacidade potencial de cada um. Daqui decorre nosso segundo conceito. Enquanto que processos de coleta de dados, análise e síntese são bem mais conscientes, o julgamento, que envolve escolha e decisão não o é. Julgamento é uma propriedade do organismo e seus processos não são diretamente acessíveis, isto é, a ‘decisão nos chega’.

Aqui chegamos num ponto em que os fatores ‘internos’ das pessoas em ação tem duas dimensões: a consciente e a inconsciente. Vejamos alguns elementos típicos e seus entendimentos:

Cognição. Envolve os processos pelos quais compreendemos o mundo, usando operações mentais como lógica, dedução, seleção de informações, hipóteses, categorização, estratificação da compreensão, conceituação ou abstração em relação ao mundo concreto, articulamos ideias, comunicamos, entre outras qualidades.

Emoção. E aqui o termo ganha várias interpretações. Entendemos como: ‘a experiência de um estado sustentado de atenção e prontidão para agir’ (Jaques, 2002). Estados de prontidão para agir aparecem, por exemplo, em situações em que um perigo é antecipado ou um ataque está para acontecer, como também emoções marcadas pelo amor. A prontidão é um estado no qual o sistema autônomo entra em ação, e nossa musculatura total está mais viva do que nunca. Não temos controle consciente sobre isto. É um exemplo da dimensão inconsciente de nossas ações.

O conceito de inteligência emocional (QE) é impreciso. O conceito de Q.I. fez um grande ‘desserviço’ na medida em que mais categorizou e pré-conceituou as pessoas do que ajudou a compreender a dinâmica delas em ação. E mais: nunca foi efetivamente validado e nunca mostrou correlação com o desempenho na vida prática (McClelland). O conceito de Q.E., em sua imprecisão, passa a ser usado para quaisquer atividades humanas não definidas pela cognição. Q.E. entra nos limites do psicopatológico, na medida em que faz referências a estados emocionais marcados por medo, raiva, depressão, entre outros (Goleman, 1999).

A inteligência emocional segue o mesmo caminho do QI. Na medida em que tenta explicar as diferenças no desempenho faz uso dos aspectos cognitivos e não emocionais em si – emoções não nos ajudam a compreender o mundo! A inteligência emocional consegue, sim, captar aspectos ‘negativos’ que podem interferir no desempenho. Resta saber se estes aspectos ‘negativos’ são decorrentes do ‘stress’ do organismo por estar ‘fora de flow’, comentado adiante. Este é nosso entendimento.

Psicopatologia. Está ligada ao conceito psicanalítico de repressão. Vários tipos de conflitos psicológicos não resolvidos são tratados pelos mecanismos de repressão. Como qualquer conhecimento consciente, o conhecimento (o que está) reprimido afeta o fluxo do trabalho orientado para objetivos. Faz isto fornecendo poderosos e atraentes objetivos (metas) – mas reprimidos – a serem escolhidos e que irão caracterizar comportamentos obsessivos, desilusões, ansiedades inexplicáveis, reações abruptas e outros comportamentos ‘irracionais’. Operam como estados de prontidão criando um contexto que está além da compreensão racional. Obviamente que tratar destas questões não é fácil. Do contrário, poderíamos ter simplesmente a possibilidade de escolher não ter ansiedade, como também parar imediatamente de fumar. Mas trazer à consciência estas questões nos capacita a ganhar mais controle na definição do foco consciente e nos limites do comportamento orientado para objetivos.

Estados emocionais dão assistência ao organismo em relação a seus objetivos, metas e desejos. Desta maneira, todo estado emocional precisa ser situacional e temporário. Estados emocionais que continuam além dos requerimentos situacionais se tornam um sério impedimento, colocando o organismo numa condição de risco, interferindo com sua capacidade de construir um efetivo e flexível campo de atenção. Tornam-se muito estranhas certas ofertas de ‘treinamento para inteligência emocional’ em um ou dois ‘cursos’, ou em grupo!

Metacognição. Desde o final dos anos 60, as ciências psicológicas passaram por grandes modificações. Uma das correntes mais importantes, representada por Luria, compreende o funcionamento mental através de quatro grandes processos cognitivos – o PASS – Planejamento, Atenção, Sequencial e Simultâneo.

Planejamento consiste na programação, regulação e verificação do comportamento. Trata de um conjunto de decisões ou estratégias que uma pessoa adota e modifica para resolver um problema e alcançar um objetivo (Das, Naglieri e Kirby, 1994).

Para estes autores, planejamento é caracterizado pelo propósito! A qualidade a ser destacada pelo planejamento é ‘a flexibilidade e avaliação’, não apenas da ação dos outros, mas, também, da própria ação e dos próprios sucessos e erros.

Um componente-chave do planejamento é a metacognição, que é a consciência e o conhecimento sobre os processos cognitivos. Planejamento e metacognição não são processos totalmente acessíveis à consciência. Contudo, sua ausência ou debilidade está sempre correlacionada ao fracasso de alguma maneira, fracasso ‘na instrução e na alocação dos recursos’ para a performance (Das, e outros, 1994). A metacognição tem dois aspectos muito importantes. Primeiro, está profundamente relacionada com a motivação: estratégias só se tornam efetivas quando combinadas a um propósito e uma necessidade. Segundo aspecto: o desenvolvimento desta faculdade acontece ‘aos saltos’, em etapas.

Metacognição tem a ver, então, com alocação de recursos nas atividades de planejamento de um comportamento ou ação de uma pessoa. Estes recursos são os conhecimentos (para coisas e pessoas), experiências, faculdades cognitivas, interesses e a compreensão dos estados emocionais.

O processo de desempenho.

O conceito de flow. De acordo com Stamp, adaptando ideias de Csíkszentmihalyi (1991), o desempenho numa tarefa, num cargo ou num projeto, é compreendido pelo conceito de ‘flow’ – uma interação adequada entre complexidade do trabalho e nossa capacidade. Quando estamos ‘in flow’, a experiência que temos do mundo e do trabalho pode ser comparada ao que os orientais definem como ‘nirvana’. Nossas decisões são eficazes e eficientes, usamos adequadamente os recursos, conseguimos considerar as diferentes variáveis afetando o escopo de nosso trabalho, e não comprometemos nem os recursos a nós depositados nem a nossa estabilidade. Estar ‘in flow’ envolve um bom encontro entre complexidade, capacidade e também o valor que atribuímos ao nosso trabalho. Se os dois primeiros estiverem adequados, mas não valorizarmos o que fazemos, nosso desempenho poderá cair. Complexidade de trabalho acima da capacidade gera ‘stress’, decisões adiadas, ansiedade e custos muitas vezes incalculáveis para a organização. A ideia de Flow descreve um organismo atuando numa experiência de ‘totalidade’, onde cognição, emoção e julgamento funcionam harmonicamente.

Como organismos orientados por objetivos e metas, estamos sempre definindo nosso campo de atenção, ou o teremos definido por alguém numa relação de trabalho, por exemplo, pela liderança.

Nossa ação será explicada, primeiro, pelas nossas decisões e escolhas. Nossas decisões e escolhas estão limitadas por nosso poder de julgamento em relação ao futuro. A manutenção, por algum tempo, de nosso poder de atenção e foco emocional depende da ausência de características emocionais negativas (e não positivas).

Somos, contudo, organismos estruturalmente determinados (Maturana, 2001) e, como tal, a quantidade de turbulência que conseguimos aceitar em relação ao ambiente está determinada por nossa estrutura. Isto é, organismos vivos são flexíveis enquanto sua estrutura consegue manter-se acoplada dinamicamente numa relação de troca com o ambiente. Não é qualquer meio que os organismos suportam. Turbulências além dos limites farão o organismo desprezar certa quantidade e qualidade de informação. É uma questão de sobrevivência.

Para entender o desempenho do ponto de vista do indivíduo precisamos considerar pelo menos duas dimensões: a horizontalidade e a verticalidade. Por verticalidade entendemos o ‘tamanho do projeto’, medido pelo horizonte de tempo de conclusão. Por horizontalidade, os atributos da capacidade humana. Estes atributos têm como limitador a capacidade das pessoas para considerar diferentes horizontes de tempo à frente. Aqui o conceito de flow é determinante. Na medida em que o horizonte de tempo aumenta em relação à capacidade do organismo, o indivíduo entra numa zona de turbulência acima de suas possibilidades. Nestas condições, os recursos metacognitivos, cognitivos e emocionais não serão suficientes para garantir desempenho. Se estiverem aquém, é provável que outros comportamentos inadequados surjam, mas não por ‘stress’ e, sim, desmotivação.

A responsabilidade do ambiente. Sendo organismos estruturalmente determinados, o ambiente – representado no trabalho pelas políticas de uma organização, liderança e condições de trabalho – tem fundamental importância. Organismos estruturalmente determinados podem ser comparados a máquinas. Toda máquina tem sua capacidade, seu limite. Podem até operar no limite, mas irão requerer pausas para manutenção ou substituição. Como seres vivos somos seres emocionais, persistentes, responsáveis. Muitas vezes, operamos aquém de nossas capacidades e nos sentimos inúteis. Muitas vezes, estamos felizes e satisfeitos, alegres e integrados. Estamos ‘in flow’. Em outras ocasiões, somos exigidos além da capacidade, fracassamos. Em muitos e insistentes casos, perdemos o trabalho, somos despedidos.

Infelizmente, muitas organizações ainda insistem no ‘princípio de Peter’ – todo mundo é promovido até o limite de sua capacidade. E perdem o emprego. É a forma empírica – e tardia de conhecer o potencial humano. Hoje, pelos trabalhos de Jaques, essa antecipação do conhecimento sobre a capacidade potencial humana está disponível. Não se justificam mais as políticas de desenvolvimento de pessoal desconsiderarem o conceito de ‘flow’. É uma questão de responsabilidade pelo conhecimento.

A responsabilidade do ambiente está em criar as condições contextuais que usem o melhor das pessoas para mantê-las tanto quanto possível dentro dos limites do flow. Isto requer conhecimento, por parte da organização e da liderança, das capacidades de cada um. E também envolve conhecimento por parte das pessoas sobre seus limites potenciais.

Os custos para as organizações e pessoas, de indivíduos fora de flow, são facilmente contabilizados. De um lado, para a pessoa, ansiedade, mal-estar, baixa autoestima, doenças, ‘stress’ e perda do trabalho. Para a organização, decisões adiadas ou malconduzidas, gastos, desperdícios, oportunidades perdidas, além de afastamentos, turnover indesejável, novas contratações.

Embora os aspectos determinantes da performance estejam em boa parte com as pessoas, elas estão inseridas num ambiente e este, pelo poder que lhe é conferido, tem vital responsabilidade pelo conhecimento sobre elas. É a função da liderança. Mas não há processo de coaching capaz de reverter condição de pessoas exigidas além dos limites de sua capacidade. Contudo, ainda se gasta muito dinheiro tentando reverter condições estruturalmente irreversíveis, pelo menos por um determinado período de tempo.

Leia mais

  • Csikszentmihalyi, Mihalyi. Flow. USA: Perenial. 1991.
  • Das,J.P; Naglieri, J.A; Kirby, J.R. Assessment of Cognitive Process. USA: Allyn and Bacon. 1994.
  • Jaques, E. Requisite Organization. USA: CasonHall. 1996.
  • Goleman, D; Trabalhando com a Inteligência Emocional. SP. Ed. Objetiva. 1999.
  • Maturana, H. Cognição, Ciência e Vida Cotidiana. MG: UFMG. 2001.
  • Jaques, E. Life and Behavior of Living Organisms. USA: Praeger. 2002.

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Capacidade, Estrutura, Liderança

Desenvolvimento do Talento

Compreendemos o talento sob duas dimensões. Uma – a não treinável – tem a ver com o nível de complexidade e incerteza de que se é capaz de lidar quando se tem um objetivo a ser alcançado dentro de um prazo definido. Chamamos isto de capacidade potencial e, neste sentido, o sistema Work Levels prevê sete níveis de talento nas organizações.

A segunda dimensão tem a ver com a aplicação da capacidade potencial, o que requer conhecimentos hábeis (para coisas e para pessoas) para que se possa lidar com os problemas, ter comprometimento e controle sobre os próprios traços de personalidade.

Chamamos de maturação o crescimento orgânico da capacidade humana em direção a níveis de complexidade maiores ao longo do tempo. Algo não treinável, e que é a matéria-prima do talento. Chamamos de desenvolvimento as possibilidades de aquisição dos conhecimentos hábeis para aplicar a capacidade potencial. Confunde-se muito capacidade potencial com conhecimentos hábeis. O primeiro – capacidade potencial – tem a ver com o uso do julgamento. O poder de discernir, julgar, enxergar à frente, não se aprende nos bancos de escola.

Desenvolver talentos inclui duas etapas. A organização precisa saber identificá-los – avaliar o potencial atual e futuro (a longo prazo) – para depois praticar o desenvolvimento. Este desenvolvimento está sob controle da gestão.

O princípio básico é que a responsabilidade pela carreira é da pessoa. Uma companhia não pode garantir as oportunidades, mas pode assegurar que dispõe de procedimentos para capacitar as pessoas a clarificar seus objetivos em relação às oportunidades e, principalmente, dispor de ferramentas confiáveis para julgar o potencial de seus colaboradores.

Numa organização como a definida pelos Work Levels, as responsabilidades são: no Estrato V, o CEO olha para os talentos dos Estratos III, a fim de identificar futuros diretores. Um board olha para os talentos do estrato IV, como potenciais sucessores do CEO. Diretores, no Estrato IV, ficam atentos aos profissionais no Estrato II. E assim por diante, tornando o processo de identificação de capacidade potencial e planejamento de carreira e sucessão algo natural dentro da organização.

O Desenvolvimento de cada pessoa

Coaching

Os gerentes, em relação a seus liderados diretos, lidam com as questões do desempenho imediato do trabalho. Precisam praticar o coaching regularmente, visando ajudar seus liderados a desenvolver suas plenas capacidades (potencial).

Coaching é ensinar, treinar (o uso hábil do conhecimento) e isto envolve a extensão do conhecimento necessário, sua aplicação hábil, articulação focada dos valores, e reforço da sabedoria adquirida. Problemas de personalidade não são foco do coaching. Devem ser apontados e discutidos com os liderados de modo a ajudá-los a ter melhor controle sobre si ou até mesmo procurar ajuda especializada, se for o caso.

Mentoring

Gerentes dois estratos acima dos liderados lidam com as questões de carreira. Participam da avaliação do potencial atual e futuro e de sua revisão periódica. Fornecem informações sobre as oportunidades de carreira na companhia. Apoiam os liderados dos estratos abaixo a definir objetivos e a persegui-los. Também asseguram que seus liderados diretos estejam acompanhando os talentos dois estratos abaixo. Mais ainda: esses mentores devem antecipar o ponto quando liderados dois estratos abaixo estiverem na condição de evoluir para uma posição um estrato acima e começar a prepará-los, mesmo sem a promessa de promoção, o que deve sempre ficar claro.

É também função do mentoring alertar os liderados de que eventualmente deverão procurar outras oportunidades fora da companhia, conforme o caso e situação. Aqui, a franqueza dever ser encorajadora e planejada, de modo a sustentar decisões conscientes de ambos os lados.

Personalidade e carreira técnica exclusiva

Não há comprovação de que determinados traços de personalidade estão associados à liderança. As pessoas podem aspirar posições técnicas ou gerenciais, por seus valores (isto é, o que querem fazer). Mas devem ser alertadas sobre a demanda das posições para fazer suas escolhas. Conhecimentos hábeis podem ser adquiridos, e este é o espírito do desenvolvimento. Capacidade para lidar com incertezas nas tomadas de decisão não é desenvolvível, mas matura com o tempo. Daí a função do mentoring, que terá condições de favorecer a realização do potencial em prazos mais longos.

A arte está na ação gerencial responsável pelo desenvolvimento do talento. O talento é parte do indivíduo, seu diferencial. A composição do Talent Pool (figura abaixo) é essencial para esta prática.

Desenvolvimento do talento sob a ótica do Talent Pool

Apenas com ele se pode visualizar os padrões de crescimento da capacidade das pessoas e sustentar uma prática de mentoring dirigida para a realização do potencial humano nas organizações.

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Carreira

Carreira, Talento e Competências

Carreira

Do ponto de vista das pessoas, a carreira deve ser encarada como desafio individual, e não da organização. Quatro pontos são importantes para o planejamento da carreira: a provável curva de crescimento do potencial, os conhecimentos hábeis, os valores e os traços de personalidade.

Curva provável de crescimento do potencial

Aceitar os limites não é uma questão fácil. Por outro lado, existem as diferenças individuais e cruciais. Há muitos jogadores, mas não é sempre que Michael Jordans, Pelés e Kuertens estão disponíveis

Fato é que conviver com os limites não é simples, principalmente numa cultura em que se valoriza a competição e o chegar à frente. Contudo, a experiência mostra que as pessoas, ao longo do tempo, vão encontrando seu ritmo próprio, seu melhor caminho e aceitando melhor suas limitações. Em geral, isso é chamado de maturidade.

Quando conduzimos assessment e praticamos feedback e coaching, fica claro como as pessoas intuem sobre o seu futuro. Trazer essas informações para um nível articulável e consciente proporciona conforto, segurança e mais objetividade ao planejamento pessoal.

Hoje pode-se estimar as curvas prováveis de crescimento da capacidade das pessoas através do Career Path Appreciation®, com base nos trabalhos de Elliott Jaques. Assim, teremos uma perspectiva da direção e dos níveis de complexidade de Artigo trabalho mais prováveis que teremos condições de assumir ao longo do tempo, como também poderemos enxergar prováveis períodos de transição, e nos preparar para enfrentá-los. Quando nossas funções estão além ou aquém de nossa capacidade, existe ansiedade ou desmotivação, com consequentes danos para a pessoa e para a organização.

Conhecimentos hábeis

Dois grandes grupos de competências – coisas e pessoas – são os desafios gerais de um profissional em qualquer nível ou carreira.

O conhecimento para as coisas inclui idiomas, informática, complexos sistemas de logística, distribuição, operação, produção. Ao mesmo tempo que ter conhecimento é fundamental, mantê-lo atualizado e transformá-lo é imprescindível. Chama-se de flexibilidade de aprendizagem.

O conhecimento para as pessoas envolve desde relacionamentos simples, de convívio em grupo e em equipes, até poder de persuasão e influência, liderança e outros relacionados.

Os conhecimentos hábeis são treináveis e estão relacionados aos nossos valores.

Valores

O que valorizamos dá a direção de nosso investimento. Se você não valoriza trabalhar com pessoas, provavelmente não conseguirá adquirir conhecimentos hábeis nessa direção, e sua performance liderando um grupo pode ser pobre.

Os valores afetam diretamente a direção que damos para nossos pensamentos, decisões, aquisições, nosso planejamento pessoal.Dentro do assessment, pode-se identificar, por exemplo, preferências por atividades, tais como, implementadoras, analíticas, criativas, persuasivas, administrativas ou ainda de apoio e ajuda às pessoas. Compreender nossas preferências e inclinações é de fundamental importância.

Traços de personalidade

Os traços de personalidade são padrões estruturais de comportamento e, como tais, tendem a permanecer relativamente constantes. É responsabilidade do profissional ter consciência de seus traços, do grau de intensidade de suas manifestações e autocontrole. Não é responsabilidade da organização cuidar da agressividade, egocentrismo ou distanciamento entre as pessoas. Infelizmente, sob o apelo da ‘inteligência emocional’, tem-se brincado muito com a questão das mudanças pessoais, oferecendo-se treinamentos relâmpagos para trabalhar as emoções e características mais profundas e arraigadas e que não são simples de modificar. Confunde-se treinamento em conhecimentos hábeis com pessoas com mudanças emocionais. Contudo, a consciência e a percepção aliadas à maturidade fazem com que tenhamos mais controle e maior adaptabilidade. Esses são os quatro principais pilares de nossa performance. Os maiores conflitos costumam se estabelecer entre os valores e os projetos pessoais e os da organização. A cultura das organizações desenvolve-se em torno da natureza dos negócios (figura acima), e muitas vezes nossos valores absolutamente não combinam.

Em organizações voltadas para ideias e produtos, pode-se ter um ambiente no qual a informalidade, a genialidade e a geniosidade sejam padrões aceitos e naturalmente compartilhados. Para algumas pessoas, esses padrões podem simplesmente ser inaceitáveis. Enquanto a organização não quer mais exercer a tutela da carreira das pessoas (e talvez nunca tenha feito), a necessidade de selecionar bem e de promover acertadamente contam demais.

Competências e organização

De modo geral, a cultura das organizações em torno dos negócios irá valorizar determinadas competências específicas e, novamente, isto poderá estar contra ou a favor de nossos valores e traços de personalidade. No quadro abaixo há um exemplo dessas características.

Talento

O talento é medido pelo sistema Work Levels®, que explica diferentes graus do talento humano (sete níveis de complexidade).

imagem

Talento se expressa como criatividade quando a complexidade do trabalho está de acordo com a capacidade (potencial) das pessoas, em conjunção com valores e conhecimentos hábeis.

Planejamento de carreira

Embora o termo planejar uma carreira esteja desgastado, todos temos ambições, expectativas e necessidades. Esse conjunto nos pressiona de um modo ou de outro, consciente ou inconsciente, em determinada direção. As crises de meia idade são comuns entre os 37 e 42 anos. Muitos as vivem de modo criativo e renovado, outros deprimem-se, amarguram-se, e têm seu círculo de relacionamentos afetado. Planejar não significa tutelar a carreira passo a passo, mas dar uma direção, o que tem a ver com valores, personalidade, autoconhecimento. Do ponto de vista das organizações, enxergar o padrão de crescimento da capacidade das pessoas é fundamental para seu planejamento estratégico. As organizações têm ‘suas carreiras’, definidas por suas core competencies e visão de futuro. Desta forma, precisam das pessoas. Mais ainda, precisam do melhor de cada uma delas.

Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

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