Resiliência na Turbulência

agosto 15, 2016

Turbulência e resiliência são palavras de uso freqüente, principalmente quando as pessoas sentem que estão diante de condições sem precedentes e na diversidade da mudança.

Resiliência tem a ver com o fazer o melhor da turbulência. Turbulência tem certas características e a resiliência tem qualidades adicionadas ao potencial de fazer o melhor de ambas. Mas cada uma destas qualidades é frágil não somente em si mesmas, mas também na rede de conexões com outras. As qualidades da resiliência requerem apoio e sustentação, o que se consegue por meio de três atividades: ‘tasking’, ‘trusting’ e ‘tending’, que podem ser utilizadas para aprofundar a resiliência de si mesmo e do empreendimento.

A imagem de ‘águas intranqüilas e ameaçadoras’ é amplamente utilizada para traduzir a turbulência. Surpresa, novidade, eventos invasores ou perturbadores, com causas desconhecidas, remédios desconhecidos, urgências desconhecidas, tempos de conclusão desconhecidos e fatores misturados também desconhecidos, criarão uma complexidade adicional em pontos posteriores no processo.

Resiliência – capacidade para ‘rebater’ mesmo nas circunstâncias mais demandantes – é a qualidade procurada tanto nas pessoas como nas organizações. Talvez até por ter um sentido mais dinâmico ‘resiliente’ veio substituir ‘robusto’.

Flow

Mihalyi Csikszentmihalyi cunhou este termo, associando-o ao ‘bem-estar’, em seus estudos sobre estresse. Estar ‘em flow’ significa viver uma situação em que nossa capacidade se encontra amigavelmente alinhada ao que estamos fazendo. Este fazer pode ser escalar uma montanha, fazer uma cirurgia, lançar dados, desenvolver um novo produto, o que quer que seja. A pessoa ‘sabe’ que a princípio é possível controlar, que tem um claro senso do significado intrínseco, porque não se pode entrar ‘in flow’ a menos que o desafio faça sentido à pessoa. A atividade se torna intrinsecamente recompensadora, o self ‘mergulha’ na atividade por se identificar profundamente com o que é feito.

O ‘flow’ não é um estado de luxúria. Sua função parece ser a de induzir a pessoa a crescer dentro daquilo que procurará como o significado e recompensas intrínsecos o mais freqüentemente possível e o alcançará somente quando se dispõe a enfrentar os desafios do crescimento e do desenvolvimento das capacidades. Isto pode ser visto nas circunstâncias em que se tem que reverter situações caóticas em experiências significativas. A ação parece ser a de desenvolver ordem a partir da desordem, conseguir criatividade em ambientes de fortes restrições.

Resiliência

A resiliência parece depender de três elementos: significado – a sensação de que vale a pensa investir energia e atenção num desafio; inteligibilidade – a confiança de que se é capaz de desenvolver alguma ordem dentro da situação; maneabilidade – a confiança de que os recursos necessários estão acessíveis. Estes elementos se cristalizam em perguntas simples: a pessoa pensa que é capaz de compreender? Pensa que é capaz de administrar? Pensa que deseja administrar as condições?

Aparentemente a inteligibilidade tem primazia. Para que os recursos estejam disponíveis é necessário ter clareza do quadro de demandas de modo que a maneabilidade é contingente à alta inteligibilidade. Mas isso não significa que a pessoa acredita que possa gerenciar bem. Inteligibilidade e maneabilidade geram forte orientação para a mudança, com a direção do movimento determinada pelo senso de significado da pessoa – se ela realmente se importa, então haverá uma motivação poderosa para buscar os recursos onde quer que se encontrem. Sem esta motivação a pessoa pára de responder aos estímulos e o mundo logo se torna incompreensível; e nem há o ímpeto de procurar pelos recursos.

Resiliência e ‘flow’ se conectam de diversas maneiras: a) ambos têm a ver com a ‘ordem a partir da desordem’; b) ambos levam a pessoa além da busca de certeza, tornando possível conviver eficientemente com a incerteza; c) ambos referem-se a modelar o próprio destino; e d) os componentes-chave de ambos são o significado e a inteligibilidade.

Bem-estar

Há analogias entre resiliência e o sistema imunológico. Alta qualidade de saúde e bem-estar tem a ver com o ‘controle do destino’. Há ligações entre perda do controle afetando diretamente o cérebro por meio dos níveis de cortisona e funcionamento hormonal. Aborrecimentos e frustrações geram o ‘mau estresse’ e podem acumular gorduras abdominais. Neurocardiologistas sugerem que de 60% a 65% das células do coração são neurais e não musculares. O coração é um poderoso gerador eletromagnético e o campo gerado por ele é profundamente afetado por nossas respostas emocionais aos desafios, surpresas e oportunidades. Ou seja, turbulência.

Turbulência

Sentir-se confortável na turbulência e na incerteza são qualidades do ‘flow’ e da resiliência: nem ‘retirando-se’ do cenário nem procurando dominar o ambiente, mas encontrando maneiras de estar harmoniosamente nele, mergulhando nele, e indo além da busca pelas certezas. Não se deixar subjugar ou submergir, mas fazer mais disto tudo.

A inteligibilidade na turbulência pode ser sumariada em três características proeminentes:

  • há uma ‘ordem para liberdade’ – novas formas e oportunidades emergirão espontaneamente do imprevisível e totalmente fluido
  • existem ‘irregularidades regulares’ – o sistema pode ser imprevisível por longos períodos de tempo, mas existem temas que podem ser discernidos
  • pequenas diferenças freqüentemente desapercebidas possuem conseqüências enormes e inesperadas

São três as qualidades requeridas para a pessoa fazer o melhor nestas condições:

  • Coerência – significado para a pessoa e para a organização como um todo torna mais provável que as coisas acontecerão por si mesmas e que novas maneiras de se fazer as coisas surgirão espontaneamente – ressonância. Coerência é a pedra de toque para o julgamento e discernimento pessoal; numa organização ela assegura que o julgamento sobre os recursos e as iniciativas estão alinhados para servir ao propósito
  • Discernimento – prospera nas ‘irregularidades regulares’ encontrando um caminho na turbulência. Discernimento é o precursor da ‘inteligibilidade’, do julgamento e das decisões sadias e robustas que assinalam para a procuradoria responsável dos recursos
  • Revisão – maximiza as chances de captar as pequenas diferenças que podem ter implicações inesperadas para a reputação, recursos e maneabilidade. Um dos resultados de se estar em ‘flow’ é que temos energia para colocar nossa atenção nos pequenos detalhes do ambiente e nos compelimos a aprender sobre onde estão os recursos, como são utilizados, o que aconteceu, o que funcionou, o que poderia ter sido feito diferentemente – sem culpar e com tolerância ao erro, o que pode ser descrito como ‘remédio’ para a irreversibilidade em condições turbulentas

A experiência do Bioss International e Gillian Stamp

A sustentação efetiva das três qualidades (coerência, discernimento e revisão) requer outras três atividades gerenciais essenciais:
~ Tasking – compartilhar a intenção, acordar que deve ser feito e para quando, acordar quanto aos recursos, criando o espaço discricionário para o trabalho e preparar para a revisão.
~ Trusting – entregar aos cuidados de alguém com propósito e confiar no julgamento individual com base na pedra de toque da coerência.
~ Tending – é o trabalho que mantém as coisas juntas, especialmente na turbulência; um cuidado contínuo, monitorando sem policiar. Como a jardinagem, o tending raramente é visto como um ‘trabalho de fato’ porque o resultado – um jardim florido, uma equipe que prospera, uma amizade para a vida toda, ou uma organização resiliente – parece que simplesmente acontece.

Resilience in Turbulence

O Tripod of Work tem sido utilizado pelo Bioss e Instituto Pieron em países e empresas diferentes, focando o desenvolvimento organizacional e da liderança.

Tripod of Work - resilience

Dá sentido ao modo de trabalhar que queremos para nós e para os outros. O desapontamento surge quando percebemos que esta unidade aparentemente simples e muito desejada de fazer as coisas é extraordinariamente difícil de alcançar e ainda mais de se manter sustentada.

A manutenção da qualidade de vida tem a ver tanto com o mudar as condições sociais de modo a mantê-las mais condutoras ao flow bem como fortalecer os recursos das pessoas de modo a que sejam capazes de experimentar o flow independentemente das condições sociais.

Cada um de nós procuraria fortalecer os próprios recursos, se pudesse escolher. Porém, alguns estão na posição de prover as condições para que outras pessoas e organizações se tornem resilientes – e isso pode ser visto como o elemento-chave da liderança.


Nota: Publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron. Baseado no artigo de Gillian Stamp – Bioss International – outubro de 2000.

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