Sem feedback, voamos às cegas

agosto 15, 2016

Sem feedback, voamos às cegas.

— Folkman

Sem aprendizagem não podemos viver. Sem feedback não podemos aprender.

— Rubin & Campbell

Não oferecer feedback é um tipo de castigo psicológico.

— Williams

Diante destas frases, o senso comum pode nos levar a pensar que o feedback é sempre bom de oferecer e receber, que é uma prática fácil e natural, algo que qualquer pessoa consegue fazer. Mas será que praticá-lo é tão simples quanto o pode parecer?

Parece ser um consenso que o feedback é central para o gerenciamento da performance, seja para o autogerenciamento como para o gerenciamento da performance dos outros. Via de regra, o feedback é considerado como um elemento importante para orientar, motivar, reforçar comportamentos e evitar passos pouco efetivos. Com o feedback, espera-se que o indivíduo possa se orientar melhor para atingir os objetivos com os quais ele se envolve.

Alguns efeitos positivos do feedback

  1. Mantém as pessoas informadas;
  2. Favorece a realização do trabalho de forma mais efetiva;
  3. Corrige eventuais erros do passado;
  4. Promove o crescimento das pessoas a partir das próprias realizações; e
  5. Estimula o envolvimento das pessoas com as tarefas.

Podendo se valer de diferentes fontes, o feedback está bastante disponível no ambiente organizacional. As fontes podem ser a própria pessoa (como objeto da autorreflexão),  uma figura de autoridade (como um gerente ou professor), os pares (dentro de uma equipe), os subordinados (quando a pessoa exerce um papel de comando), uma avaliação psicológica, um amigo; mas em todas elas é preciso que a fonte seja identificada como digna de confiança para que o feedback possa favorecer a obtenção de efeitos consistentes. Seria ingenuidade pensar que qualquer prática que envolva seres humanos pode ser levada adiante de uma forma intensa e produtiva sem que exista uma relação de reciprocidade entre quem oferece e quem recebe.

Apesar de acessível e importante, obstáculos podem surgir e tornar difícil a apropriação deste recurso, gerando efeitos indesejáveis ou contrários a intenção original da prática.

Dificuldades para dar feedback

  1. Poucas pessoas gostam de discutir as próprias dificuldades;
  2. As pessoas não acreditam na fonte do feedback;
  3. Os envolvidos não são suficientemente confiantes para lidar com críticas;
  4. O feedback é utilizado apenas como instrumento de poder; e
  5. O feedback é deliberadamente destrutivo ao invés de construtivo.

Entretanto, os efeitos do feedback sobre a performance dependem da característica motivacional da pessoa envolvida; e seu estilo individual e valores também atuam como variável acerca da importância que ela atribuirá para o feedback. Vroom cita um estudo realizado na França em 1958 no qual grupos de pessoas com alta motivação para conquista de metas desempenhavam melhor quando recebiam feedback acerca dos resultados nas tarefas; e que grupos de pessoas com alto interesse em afiliação aumentavam o desempenho quando recebiam feedback acerca de “sentimentos”, mais do que em relação à realização das tarefas.

Alguns tipos de feedback

  1. Feedback positivo: reforça o comportamento;
  2. Feedback corretivo: muda o comportamento;
  3. Feedback insignificante: vago e genérico;
  4. Feedback ofensivo: destrutivo;
  5. Feedback inadequado: feito com base naquilo que o indivíduo não pode mudar; e
  6. Feedback silencioso: é não-verbal, normalmente dado “sem palavras”.

O feedback positivo visa reforçar o comportamento toda vez que ele ocorre. Dar feedback positivo é diferente de apenas dizer “muito bem”, além disso, ele deve enfocar os comportamentos que são valorizados ou eficientes para que o resultado final seja atingido.

Dar um “tapinha nas costas” é bem diferente de oferecer feedback positivo. Dizer para a pessoa que um trabalho foi bem feito normalmente aumenta o bem estar e costuma inflar o ego, mas não vai além disso. O feedback positivo deve deixar claro quais as forças do indivíduo são importantes para a organização.

A definição de elogio ou feedback positivo pode ser entendida como aquele que identifica o comportamento ou resultados desejados de seu pessoal ou aqueles que ultrapassam as expectativas. O propósito do elogio é incrementar os comportamentos desejados em seu pessoal ou a performance dele. O impacto do elogio é significativo, aumenta a confiança do colaborador, a performance e a motivação (Hataway, 2006).

Muitas pessoas consideram que é bastante fácil dar um feedback positivo, e eles quase não ocorrem no dia-a-dia do trabalho. Prover a pessoa com feedback positivo implica em uma ação de afirmação, de aceitação ou aprovação de algum comportamento ou ação.

Feedback corretivo ou crítico pode ser definido como a arte de avaliar ou analisar com conhecimento e propriedade. Normalmente as pessoas definem um feedback crítico como sendo um ato de criticar de forma desfavorável, sendo que a crítica é entendida como uma forma de apontar aquilo que nunca dá certo e não como uma oportunidade de desenvolvimento.

Quando o feedback crítico é entendido como uma oportunidade de expandir nossa compreensão, é mais uma ferramenta para chegarmos a resultados positivos. Oferecido com propriedade, ele se torna um feedback construtivo (Hataway, 2006).

Precisamos também compreender que existe uma diferença entre uma crítica positiva e uma crítica negativa e elas devem fazer parte de um balanço na avaliação da performance ou do comportamento.  Em ambos os casos elas devem e podem ser construtivas. Para Bee & Bee (2002), a crítica construtiva visa corrigir e melhorar o comportamento de baixa qualidade ou insatisfatório e deve fornecer informações sobre o comportamento e o desempenho com base em dados objetivos, estimulando aquele que está sendo criticado a comprometer-se com a busca de padrões estabelecidos de comportamento e desempenho.

Contudo, este tipo de feedback se afigura como o mais difícil de acordo com Williams (2005), uma vez que o que podemos também observar é que somente as pessoas com elevado grau de confiança tendem a considerar as críticas como estímulos para fortalecer o desempenho delas.

Feedback genérico ou vago é aquele que aborda uma expressão global do problema, por exemplo, quando nós dizemos a uma pessoa “você precisa se comunicar melhor” ou “você precisa motivar mais os outros”. Este feedback provavelmente deve refletir esforços de mudança em termos globais. As pessoas podem dizer “eu estou melhorando minha….” e no final da sentença colocar os termos: comunicação, motivação, consideração.

Quantas vezes nós ouvimos as pessoas dizerem que conhecem as suas dificuldades e os pontos que precisam ser melhorados, mas quando perguntadas acerca de quais ações elas tem levado a efeito para tal, surge uma frase assim “eu tenho refletido sobre…”.

Folkman (2006) afirma que metas globais não levam a nenhum comportamento específico e fazem com que nós evitemos o teste da realidade. Ao não estabelecermos metas que podem ser avaliadas de forma concreta ou quando não temos parâmetros definidos, não podemos avaliar se estamos melhorando ou não; ficamos apenas na expectativa ou na crença de que estamos fazendo o que é necessário.

Feedback ofensivo: o feedback ofensivo ou destrutivo pode ser baseado no desprezo ou em ataques diretos à pessoa. Para Bee & Bee (2002) “o feedback destrutivo costuma acontecer só quando as coisas saem erradas (esse tipo de atitude lhe parece familiar?) e quando não há padrões pelos quais se pode avaliar o desempenho ou o comportamento, ou qualquer plano que vise o desenvolvimento.

O feedback inadequado, que tanto pode ocorrer em função do momento ou em função daquilo que a pessoa tem poucas condições de mudar (uma pessoa me disse uma vez que não gostava da “cara” de um trainee em uma avaliação do trabalho). Segundo Paula (2005) este tipo de feedback pode trazer consequências psicológicas indesejadas e aumentar o sentimento de insuficiência das pessoas.

Muitas vezes o feedback acontece depois de muito tempo do comportamento ou dos resultados atingidos, ou então não levam em consideração a capacidade da pessoa em lidar com críticas, a sensibilidade de cada um. Creio que todos nós sabemos o que é levar uma bronca na frente dos outros, por mais justo que seja o motivo.

Ocorre que em muitas empresas o feedback aparece somente nas avaliações que ocorrem no final de cada trabalho ou mesmo no final de um ano. “Muitas vezes, a pessoa se vê soterrada pelas críticas, que não raramente se referem a questões e acontecimentos ocorridos há muito tempo, que já não estão claros na memória e sobre os quais a pessoa não possui mais qualquer influência” (Bee & Bee, 2002).

O tipo de feedback que é chamado feedback silencioso, segundo Hataway, é aquele que não provê nenhuma resposta verbal. De acordo com a autora, o propósito deste tipo de feedback é manter o status quo e com ele não existem surpresas; se bem que o efeito do silêncio tende a ser uma diminuição na motivação e na performance dos empregados.

Mas o feedback silencioso não quer dizer que não exista uma comunicação, pois não precisamos mandar mensagens somente com palavras. Muitas vezes, a postura daquele que deveria dar o feedback denuncia, de forma sutil ou não, que algum tipo de comportamento ou resultado gerou algum impacto. Nestas ocasiões, o silêncio fala…

Quando o comportamento ou as contribuições da pessoa são ignorados, ao não receber feedback quando solicitado ou então,recebê-lo centrado apenas naquilo que a pessoa fez de errado, é improvável que alguém siga motivado ou que isso venha a fazer com que a pessoa tome mais iniciativas para contribuir.

Provavelmente, muitas dificuldades derivam de o  feedback não apresentar critérios e objetivos claros, bem como, de as pessoas ou a organização não terem o hábito de oferecer ou receber feedback; ou seja, elas simplesmente não sabem “como fazer”. Entretanto, pedir e prover feedback são habilidades, e como tais, podem ser aprendidas e desenvolvidas. E da mesma forma como qualquer outro tipo de relacionamento, ele segue regras e precisa ser baseado em princípios, tais como, respeito mútuo, visão positiva do ser humano e responsabilidade por resultados, entre outros.

Papéis para os gerentes

Sue Bishop atribui seis papéis fundamentais para o gerente quando desempenha um papel no qual ele precisa oferecer feedback. São eles:

O gerente como avaliador: quando a avaliação do trabalho é feita revelando um equilíbrio entre uma atividade bem realizada e uma observação construtiva para a melhora da performance, normalmente as pessoas aceitam o feedback sem defensividade ou ressentimentos. Mas esta prática não pode ser realizada uma vez ao ano, mas sim, em uma base regular. Os gerentes e a equipe precisam monitorar constantemente o progresso, motivação, resolução de problemas.

Para que um trabalho seja bem apreciado, ele precisa ter alguns padrões estabelecidos, que precisam ser discutidos e comunicados à equipe, para que se possa monitorar a performance passada e presente.

O hábito de documentar as conclusões de uma reunião, quais decisões foram tomadas, por exemplo, servem como ponto de apoio para encorajar as pessoas a melhorar a performance, uma vez que os objetivos ou acordos estão claros.

A avaliação também deve contemplar um clima de parceria entre o gerente e o colaborador, até para que surja a oportunidade de o gerente receber feedback de como o seu modelo de gerenciamento está sendo percebido e, da mesma maneira de quem recebe, o que pode ser melhorado.

O gerente como coach: coaching é uma das áreas do gerenciamento na qual dar (e receber) feedback construtivo é um elemento chave ao considerarmos que, dentre tantas outras habilidades, o coach deve ser um bom comunicador e hábil para ouvir e instigar quem recebe o coach a identificar as suas áreas de problemas e a incrementar alternativas.

Como coach, ao oferecer feedback para um colaborador, três assuntos devem ser abordados, que  por parecerem um tanto óbvios, por vezes são deixados de lado.

  1. Forças e oportunidades de desenvolvimento;
  2. O impacto das ações individuais no trabalho; e
  3. Quais os caminhos para se fazer as coisas de modo mais efetivo.

Além disso, não podemos esquecer que o feedback sobre a performance deve ser dado rápida e frequentemente, buscando um equilíbrio entre uma apreciação do trabalho bem feito com as informações necessárias para que a performance aumente.

O gerente como censor: como todo excelente gerente, que sabe dar um feedback construtivo no momento certo, em algumas ocasiões será necessário usar uma abordagem mais corretiva com o staff. As atitudes corretivas podem ir de um assinalar, passar por um repreender e chegar à demissão.

O propósito deste tipo de abordagem é o de chamar a atenção da pessoa às falhas na performance, comportamentos inadequados e, como a maioria das formas de feedback, deve ser composto de um balanço entre o elogio e a crítica.

O maior propósito da crítica é ser construtiva. Comentar somente o que deu errado sem sugerir uma solução é essencialmente destrutivo e a intenção deveria ser identificar e ajudar a pessoa a corrigir os comportamentos inaceitáveis sem comprometer a autoestima.

Critique o comportamento de forma bem específica, nunca a pessoa pelos seus traços pessoais, pergunte à pessoa como ela vê o problema e cheque se ambos estão entendendo a mesma coisa.

Lembrando que, segundo Williams, este tipo de feedback é um dos mais difíceis. Frequentemente ocorre o julgamento, as relações de poder tendem a aflorar, ainda mais quando quem oferece o feedback tem uma tendência a encontrar bodes expiatórios para as suas próprias deficiências.

O gerente como conselheiro: aconselhar é um tema vasto. Bishop entende que o “Counselling” (com C) deveria ser conduzido por pessoas não somente bem treinadas ou qualificadas, mas emocionalmente competentes para lidar com os problemas dos outros de forma isenta, mas sem perder a empatia.

Mas o “counselling” (com c) é parte de qualquer tipo de gerenciamento, quando um membro do staff necessita de conselhos em um nível pessoal. O gerente pode não se sentir tão confortável neste papel, então é de sua responsabilidade discutir a possibilidade de uma ajuda especializada.

O “counselling” envolve captar emoções, sentimentos, interpretá-los ou demonstrar que há uma disponibilidade para ouvir e compreender, não somente fazer recomendações, mas refletir com a pessoa acerca do que ela quer dizer, ajudá-la a analisar o problema, proporcionar pontos de vista diferentes.

Raramente, dificuldades pessoais podem ou devem ser exploradas em reuniões. É preciso encontrar o espaço certo para deixar a pessoa se expressar, fazendo observações se necessário, desde que um rapport tenha sido previamente construído para não tornar a pessoa reticente. A pessoa precisa saber que está sendo ouvida e que as suas questões podem ser tratadas de forma positiva e construtiva.

O gerente como um “apresentador”: quando fazemos uma apresentação precisamos levar em consideração a resposta do público-alvo. A comunicação em duas vias nos diz que para que uma pessoa dê o melhor, ela precisa saber se as suas palavras estão repercutindo. É necessário um constante ajustamento e reajustamento acerca das palavras, gestos, expressões faciais. Sendo a resposta positiva ou negativa, ela é fundamental para a comunicação.

Então, para saber se os seus esforços como aquele que oferece feedback estão sendo atingidos, você precisa receber feedback. Quanto mais se fica mergulhado na leitura de notas, gráficos, sem olhar para as pessoas ao redor, mais tediosa se torna a “apresentação”. É, portanto, necessário prestar atenção nas reações da platéia e ter estratégias diferentes para atingir o público.

Se você sabe que não é um bom orador ou que “falar em público” não é o seu forte, seria interessante fortalecer esta habilidade através de um curso ou workshop no qual você pudesse praticar a sua apresentação.

O gerente como selecionador: por vezes, precisamos oferecer feedback nos processos seletivos, situação que se  torna particularmente desagradável quando temos de lidar com pessoas que não foram admitidas.

Neste caso, a técnica “sandwich” pode ser apropriada (para quem não sabe, a técnica “sandwich” é começar e terminar com pontos fortes), ainda aqui o feedback deveria ser sempre balanceado. Nós temos uma tendência a lembrar mais facilmente da primeira e da última coisa de uma lista, esquecendo o que está no meio, o que no caso do feedback também é importante como aspectos para uma revisão por parte da pessoa.

Como ao oferecer feedback temos um compromisso com a honestidade das informações, considerar somente os aspectos positivos de um perfil seria no mínimo uma visão ingênua, até porque “positivo” e “negativo” admitem valores bastante relativos quando falamos de seres humanos.

Feedback, muitas vezes, significa fornecer informações ou fatos, sejam eles aceitos ou não, e precisa ser constante, objetivo, tornando-se efetivo quando os envolvidos trabalham juntos e quem o recebe assume a responsabilidade pelo seu próprio desenvolvimento, incrementando uma dinâmica de constante movimento em relação à mudança e aperfeiçoamento. Desenvolver habilidades para oferecer e receber feedback é, segundo Bee & Bee, “quase como adotar um novo estilo de vida”.


Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

 

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