Sistema Assessment

agosto 15, 2016

“Conheça a si mesmo” nos remete ao autoconhecimento, a uma das mais importantes competências para o desenvolvimento pessoal. Contudo, esse conhecer-se tornou-se quase impossível com o advento da Psicanálise no Séc. XX. Freud e seus discípulos nos colocaram frente ao inconsciente, fazendo do autoconhecimento um intenso trabalho, um profundo processo, que pressupõe que não somos conscientes da totalidade do que somos.

Nos anos 70 a Janela de Johari fez sucesso nos programas de treinamento. Falava das áreas conhecidas, das desconhecidas e também das “cegas”, as inacessíveis ao indivíduo e a outras pessoas. Sem dúvida, esses princípios ainda permanecem válidos.

Agora, esses princípios são resgatados pelo ângulo do assessment, segundo o qual há múltiplas perspectivas nas avaliações. A introdução do termo nas ciências humanas aplicadas aconteceu no final dos anos 50, quando a AT&T estruturou um programa de identificação de talentos gerenciais e se propôs a fazer acompanhamentos ao longo de 10 anos para verificar o grau de precisão das predições. Os estudos constam no livro The Assessment Center (Byham, 1978). Daí originaram-se as práticas mundialmente utilizadas dos assessment centers. No Brasil algumas empresas começaram a utilizá-las no final dos anos 80 e minha experiência na Rhodia é um exemplo. Entretanto, o termo assessment somente ganhou presença marcante em RH a partir da metade da década passada.

Na estrutura original dos assessment centers, pessoas (os avaliados) são acompanhadas por múltiplos avaliadores (gerentes seniores da organização, psicólogos e consultores especialmente treinados) e participam de atividades programadas, como entrevistas, jogos e simulações em grupo, testes e apresentações.

O espírito dos assessment centers é a multiplicidade das avaliações e avaliadores. A essência do assessment center é “NUNCA DEPOSITE NUM SÓ INSTRUMENTO AS CONCLUSÕES SOBRE UMA PESSOA“. Compreender uma pessoa é uma tarefa de grande responsabilidade e acreditar que um único instrumento é suficiente para tal é de uma ingenuidade atroz.

Nos últimos 40 anos (refiro-me às primeiras experiências com os assessment centers), muita coisa mudou. O mundo, diz-se, está dinâmico; o tempo, menor; a velocidade, maior; e há necessidade de respostas rápidas. Solução? Avaliações rápidas por computador. Sua validade? Bem, depende da aplicação e qualidade da pesquisa, e fundamentos de cada instrumento. Mas, há algumas boas práticas.

O melhor sistema é aquele que consegue dar uma ampla perspectiva sobre a pessoa, olhando-a de diferentes ângulos, sem abrir mão do princípio de múltiplos instrumentos. Contudo, a condução de assessment em três ou quatro dias começa a se tornar difícil, pelo tempo e custos envolvidos.

Soluções encontradas

Assessment center típico, sintetizado

Os trabalhos concentrados têm dado bons resultados. A estrutura de um dia de trabalho para grupos reduzidos (cerca de 12 pessoas, por exemplo) pode envolver instrumentos e 360 graus conduzidos eletronicamente; algumas atividades em grupos; entrevista com consultores e com gerentes e feedback em horário posterior. Este modelo tem-se mostrado prático e eficiente. Os feedbacks dos participantes são muito positivos e empresa e pessoa obtêm um amplo espectro de percepções, que depois são utilizadas em planos de desenvolvimento.

Assessments individuais

Nestes processos, o assessment individual prescinde das atividades em grupo. A ênfase é colocada nos processos de entrevista e testes, e a perspectiva 360 graus. Os processos de entrevista podem ser conduzidos de diferentes maneiras:

  • Entrevistas por competências – focando histórico de realizações e identificando estratégias de solução de problemas. São, no mínimo, duas horas com o avaliado.
  • Avaliação de conhecimento e estratégias de solução de problemas especializadas – foco no domínio de conhecimentos especializados e uso deles. São analisados velocidade no processamento e uso de informações e de estratégia de pensamento.
  • Motivações de carreira – são perguntas simples e cruciais, como: “o que, de fato, é motivador fazer?”; “se pudesse escolher as atividades e organizá-las no tempo, como faria?”; ou ainda, “você gosta, efetivamente, de trabalhar com gente?” O que se quer saber são os valores práticos das pessoas e em qual direção se sentem mais confortáveis dirigindo suas capacidades.

Os instrumentos de assessment

Em resumo, coloca-se dentro do conceito de assessment toda e qualquer avaliação sobre uma pessoa. Podemos classificar os instrumentos:

1. Questionários e inventários

São dois tipos: questionário único, baseado num conceito. Exemplos típicos são os que se baseiam em tipologia (a mais comum é a Junguiana), e sistemas com múltiplos testes que se aproximam do modelo de assessment.

Como ilustração de questionário único, comentamos o modelo Insights Discovery.

Como ilustração de múltiplos testes num só sistema, podemos citar o LPA, que é um dos componentes do nosso processo de Assessment Estratégico. Baseado em pesquisa e fundamentado em diferentes autores, o LPA é uma sistema de seis questionários e seus relatórios fazem cruzamentos das combinações usuais e não usuais entre os questionários, simulando, de fato, um sistema de assessment center. Moderno, pode ser feito online. O LPA cobre a percepção de uma pessoa sob múltiplas perspectivas: papéis em equipe; gestão de conflitos; estilo pessoal; estilos de aprendizagem; estilo de trabalho; e escala profissional gerencial. O LPA é uma opção altamente diferenciada para assessment, principalmente de executivos.

Todos estes sistemas são oferecidos com suporte tecnológico, sendo que o LPA tem como diferencial a produção de perfis, comparação de pessoas com múltiplos perfis, análise de equipes, comparação entre equipes, montagem de equipes, além de um amplo sistema de apoio estatístico que permite a criação de normas próprias e a comparação das pessoas com diferentes normas, entre outras facilidades, como a customização do output com base em competências. Vai além do assessment em si, oferecendo uma ferramenta de gestão da informação produzida.

2. O 360 graus, amplamente difundido

Contudo, o diferencial que poucos (ou nenhum) sistemas trazem aparece na utilização do ELDI. Baseado em conceitos de Kegan sobre desenvolvimento e maturidade, o ELDI identifica os chamados inibidores de performance que todo alto executivo não deveria ter ou, pelo menos, deveria tê-los muito controlados. São chamados de inibidores traços como arrogância, interferência, temperamento, inacessibilidade, agressividade e egocentrismo. Estes traços nunca aparecem nas avaliações 360 graus, que focam somente o positivo, não favorecendo investimento profundo no autoconhecimento.

3. Testes de Personalidade

Questionários e inventários não são testes de personalidade. Bons testes, utilizados como base para feedback, geram reflexões profundas e importantes para os avaliados. Os melhores instrumentos de diagnóstico ainda estão em torno de Rorschach e TAT, análises grafológicas feitas com critério e uso de feedback, Pfister e Lüscher, por exemplo. São sistemas que permitem entrar no mundo interior das pessoas e conversar com elas sobre questões mais profundas. Lembrem-se de que estamos falando de autoconhecimento.

4. O Potencial

Infelizmente o mercado trata tudo o que foi abordado acima como potencial. Potencial tem a ver com crescimento futuro. Assim, poder conversar com as pessoas acerca da tendência de crescimento de suas capacidades ao longo do tempo (10, 15, 20 anos à frente) fecha o cerco dos assessments. Contudo, falar de potencial requer conceito e metodologia. Mais uma vez temos que nos remeter para o sistema Work Levels – o único que permite esse tipo de estimativa de maneira científica. Com base no Work Levels pode-se discutir com cada pessoa a estimativa de trajetória de carreira com base nos níveis de complexidade de trabalho. Esta informação, que não aparece em nenhum dos sistemas acima descritos, é específica e requer procedimento especializado.

Em resumo, sistemas de assesment devem produzir uma leitura de cada pessoa por vários ângulos: seu potencial – atual e futuro; seu perfil de traços e competências, suas forças; seus valores (direção que quer dar para o uso de sua capacidade); aspectos de personalidade que podem interferir em seu desempenho; como é percebido em seu desempenho (360 graus).

O que fazer com os pontos fracos? Um estudante fez avaliações na escola e os resultados apresentados para o pai foram: “seu filho é muito bom em português, mas muito fraco em matemática”. O pai não teve dúvidas e contratou uma excelente professora de português.

Pontos fracos devem ser tratados de duas maneiras. Primeiro, ajudar o avaliado a reconhecer e aceitá-los. As informações do assessment são de extrema valia para tal. Tem a ver com o autoconhecimento. Segundo, ajudar o avaliado a desenvolver estratégias de controle que evitem que estes pontos interfiram em seu desempenho. Traços de personalidade não são pontos fortes ou fracos. Querer que alguém deixe de ser introvertido para ser extrovertido é uma brincadeira de mau gosto. As empresas gastam muito mais dinheiro querendo modificar o indivíduo em vez de investir no que a pessoa tem de melhor. Gerenciar é, sim, uma arte e uma vocação. O assessment é um instrumental que pode facilitar a vida da organização e de cada pessoa envolvida. Mas é na relação da pessoa consigo mesma e com sua liderança que as informações serão de fato aproveitadas.


Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

 

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